Por que é tão difícil para essa geração ser cobrada por etapas simples da vida como pagar o próprio papel higiênico?
Um dos maiores paradoxos da minha
geração de mulheres é a dicotomia entre a capacidade de reivindicar a liberdade de exercer
diferentes comportamentos individuais e, na mesma
intensidade, reclamar da opressão externa. Como se só o que
faltasse mesmo fosse o “aval” da sociedade para que as reclamantes sejam
quem elas querem ser. Segunda elas, embora não tenha nenhuma lei que impeça seu acesso profissional , a
“opressão da sociedade” ainda proibe essas maravilhosas fadas de existirem
em sua plenitude.
Chamou atenção um recente texto de
Facebook, desses que as pessoas por se sentirem acolhidas em uma primeira
reação , passam a compartilhar o troço sem notar que estão depondo demais
contra si mesmas porque o imediatismo impede uma segunda análise mais
criteriosa que, se fosse feita, traria uma sensação vergonhosa – caso o
sujeito tivesse um pingo de dignidade e um tantinho assim de maturidade.
O texto tratava de um desabafo, um
chororô brabo de uma moça na casa dos 30 anos que após cinco meses sem
falar com o pai resolve ligar para o "homem" e ouve um “e aí, já consegue
se sustentar sozinha? ”.
Pronto, estava servido o drama e ao longo dessa coluna, vou compartilhar alguns trechos do relato supracitado.
“O que
quero aqui é refletir um bocado sobre essa pressão absurda que a
sociedade nos impõe de sermos financeiramente bem sucedidos antes dos 30
anos.”
Pressão da sociedade, entende-se:
pergunta de um pai que está querendo ver sua filha andando com as
próprias pernas. Ele não estará sempre lá para enviar o dinheiro de uma
ou outra conta atrasada, o aluguel, o condomínio; esse pai sabe que o
tempo de provedor dele pelas leis inexoráveis da vida vai acabar e
talvez não saiba o que falar para a filha adulta como incentivo. O pai
que veio de uma geração em que se casava aos 20, aos 30 dava entrada na
casa própria e já havia pelo menos um ou dois filhos em casa. Dá para
ser errante com uma família que depende de você? Por que é tão difícil
para essa geração ser cobrada por etapas simples da vida como pagar o
próprio papel higiênico?
“É óbvio
que eu gostaria de já estar totalmente resolvida aos meus 26 anos, não
precisar da ajuda de mais ninguém pra absolutamente nada, sair do país
duas vezes por ano e tudo mais. No entanto, essa não é a minha realidade
– nem a de ninguém que eu conheça”.
O ideal de sucesso dessas pessoas é
totalmente corrompido e é o resultado do que elas absorvem ao ver as
diversas "personas virtuais" dos seus contatos online. Essas personas
virtuais são cuidadosamente montadas: viagens, empregos, cursos são
postados… Mas quem sabe a realidade? É evidente que pouquíssimas pessoas
têm interesse em compartilhar as vicissitudes da vida. Lembrem-se: a
foto do mochilão no Leste Europeu pode esconder uma enorme dívida no
cartão de crédito.
“E se
for mulher, dieta nela. Porque não pode engordar de tanto estresse, né
mores, senão não ~arruma um homem~. Porque, né, no meio disso tudo, cê
não pode apenas optar em não namorar ninguém, vai ficar pra titia”.
Qual seria o problema em se transformar
em uma alegre senhora que não se casou e que tudo bem, não sentiu
segurança nos amores que a vida lhe ofereceu e optou por criar gatos e
dedicar o amor aos sobrinhos? Acontece.
Não engordar, nesse caso, é não
ter talvez uma relação de escapismo com a comida, o que é uma relação
nociva. Quanto ao corpo de uma mulher ser rechonchudo… Será que os
homens não preferem que as mulheres sejam simplesmente felizes?
Confortáveis com seus corpos? Já experimentou deixar de ser chata?
Talvez o correto seja levar a vida que
dá, mas sempre com dignidade, fé e disciplina, porque a felicidade pode
estar na recompensa e na fé por conquistar algo e dedicar-se a esse
propósito: seja um trabalho, uma criança, um amor, um projeto de estudo.
Como pode alguém querer todas essas coisas e ainda apontar que os
únicos meios honestos para conseguir todas elas não devem ser
objetivados porque na verdade tratam-se de “injustas imposições da
sociedade”?
Pior é ver o quanto de gente se identifica com esse discurso
(mais de 20 mil compartilhamentos). Essa geração que se acha
privilegiada e que “merece” ser recompensada, porque “é muito especial”.
Mas o que fazem essas criaturas para serem tão iluminadas que não podem
pegar no pesado para conseguir as próprias realizações pessoais? Ah,
isso jamais saberemos.
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