“A ‘narrativa da tortura’ engrossa o rol de ridicularia da esquerda em um de seus momentos mais críticos”
Causou
grande consternação nas redes sociais e nas hostes progressistas a
determinação de um juiz do Distrito Federal que ordenou, há poucos dias,
a desocupação de uma escola na cidade de Tabatinga. Na decisão, o
magistrado autorizou a Polícia Militar a utilizar técnicas alternativas
para o cumprimento da ordem, como proibir a entrada de mantimentos e
privar os invasores do sono, mediante o uso de equipamentos de som para
mantê-los acordados. Entre os “ocupantes” há muitos menores de idade –
daí o cuidado de não se determinar a desocupação à força, pura e
simples, como se vê na reintegração de posse de invasões, nas quais
bombas de efeito moral e balas de borracha normalmente são utilizadas em
caso de resistência ao cumprimento da ordem.
Mas
quem disse que o cuidado do juiz ao preservar a integridade física dos
menores também não geraria enorme grita na esquerda? Foi exatamente o
que aconteceu: rapidamente a decisão foi equiparada a “tortura”, já que a
privação do sono é um meio de minar a resistência de prisioneiros dos
quais se procura obter alguma informação, e é também uma tática de
guerra psicológica que já foi muito utilizada em combate. É claro que a
equiparação é totalmente descabida e exagerada, fruto da já conhecida
histeria da esquerda: um misto de messianismo auto-imposto e má-intenção
indisfarçável na condução das suas “narrativas”.
A
tortura é proibida por convenção internacional à qual o Brasil aderiu
por intermédio do Decreto n. 40, assinado em 15 de fevereiro de 1991
pelo então presidente Fernando Collor. A “Convenção Contra a Tortura e
Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes” foi
aprovada pela Assembléia da ONU em 1984, com a tramitação para sua
promulgação no Brasil tendo iniciado em 1989. Pois bem: logo no art. 1º,
o decreto conceitua “tortura”:
“Para os fins da presente Convenção, o termo “tortura” designa qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de uma terceira pessoa, informações ou confissões; de castigá-la por ato que ela ou uma terceira pessoa tenha cometido ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais dores ou sofrimentos são infligidos por um funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência. Não se considerará como tortura as dores ou sofrimentos que sejam conseqüência unicamente de sanções legítimas, ou que sejam inerentes a tais sanções ou delas decorram”.
A
“narrativa da tortura” estava se apoiando no fato de a privação de sono e
víveres ser um “tratamento desumano e degradante”, mas esquecendo do
principal: a determinação vinha em uma ordem judicial de desocupação,
que considerou a presença dos estudantes nas dependências de prédio
público, impedindo a realização das atividades normais lá desempenhadas,
ilegal. Ou seja, se está diante de dores ou sofrimentos que são
conseqüência unicamente de sanções legítimas.
Voltemos às reintegrações
de posse que, volta e meia, são exibidas ao vivo no noticiário
televisivo: quando os invasores resistem ao cumprimento da determinação,
a polícia usa a força física e implementos como bombas de efeito moral e
jatos d’água. É bem verdade que, há alguns anos, o episódio do
“Massacre do Pinheirinho” (em que NINGUÉM morreu) já foi um ensaio geral
da “narrativa da tortura”. Afinal, de acordo com a esquerda
escandalizada, era legítimo que quem não tinha onde morar morasse lá – a
ordem judicial de reintegração de posse, a ilegalidade da invasão, tudo
isso era um mero detalhe.
É óbvio que a histeria coletiva do “Massacre
do Pinheirinho” foi um episódio cuidadosamente elaborado pelos
roteiristas habituais das “narrativas” da esquerda, na tentativa de
transformar o episódio em um “símbolo de resistência” contra um oponente
político. Exatamente a mesma coisa está acontecendo agora, com a
“ocupação” de escolas públicas.
Não
deveria causar surpresa que a “narrativa da tortura” tenha surgido logo
após uma seqüência tragicômica de vídeos em que os “secundaristas” são
entrevistados sobre os motivos das “ocupações”, e não conseguem explicar
sequer o significado da sigla “PEC”, da proposta de emenda à
constituição contra a qual, supostamente, estão rebelados. A “narrativa
da tortura” também é uma resposta enviesada ao terrível episódio
acontecido em uma escola “ocupada” em Curitiba, no qual dois estudantes,
após usarem drogas, se desentenderam e um acabou morto pelo outro – com
uma faca do refeitório do colégio. Uma das integrantes do movimento
tentou dizer, em depoimento prestado à Assembléia Legislativa do Estado
do Paraná, que embora os dois alunos estivessem participando da
“ocupação”, a culpada pelo crime era “a sociedade”.
Não colou: foi
pregação para convertidos, e só eles aplaudiram o espetáculo de cinismo
que, tivesse sido dado por um adulto, teria sido ainda mais criticado.
Na verdade, a jovem foi só a interposta pessoa entre os verdadeiros
articuladores das “ocupações” – a CUT, que controla o APP Sindicato no
Paraná – e os ouvintes do discurso. Filha de um integrante do PT, a
pretensa “Malala das araucárias” não tardou a aparecer em fotos abraçada
à senadora Gleisi Hoffman e recebeu um telefonema do ex-presidente Lula
parabenizando-a pela atuação.
A
“narrativa da tortura” engrossa o rol de ridicularia da esquerda em um
de seus momentos mais críticos: os PT e suas linhas auxiliares foram
apeados da presidência da república e varridos do mapa nas eleições
municipais. Nos EUA, uma virada eleitora de Donald Trump parece a cada
dia mais provável. O “protagonismo” da esquerda – e seu controle da
máquina e do cofre público – vai minguando, e depois de décadas nadando
de braçada e ainda sem uma oposição verdadeiramente organizada, a
esquerda está acuada e enfraquecida. É exatamente por isso que ela está
usando crianças e adolescentes como se fossem “escudos humanos”,
insuflando-os a “ocupar” escolas e desafiar a lei exatamente para que,
quando a primeira ordem de desocupação for cumprida, ela possa criar um
“mártir” – ou, na falta dele, gritar que houve “tortura”. Não se pode
esquecer que a advogada do PT que auxiliava os “ocupantes” da escola na
qual aconteceu o homicídio tentou rapidamente capitalizar o cadáver,
botando o crime na conta do “ódio e intolerância da direita” horas antes
da Secretaria de Segurança elucidar o assassinato, e revelar o que
realmente aconteceu.
Tudo isso mostra
que a esquerda moderna já superou seus paradigmas do passado: o
operário e o guerrilheiro não são mais os soldados revolucionários por
excelência. Essa função, hoje, é distribuída entre os criminosos
“comuns”, os cães-de-fila defendidos ardorosamente pelo ideário
progressista como “vítimas da sociedade”; e o estudantes da rede
pública. As escolas e universidades públicas há muito se tornaram
verdadeiros madraçais ideológicos, ambientes que alternam a pregação e a
permissividade: com a tolerância e o incentivo à sexualidade precoce e o
consumo de drogas, os jovens são seduzidos pelo ambiente de “novidade” e
transgressão; como uma espécie de “contraturno” dessa balbúrdia, há a
pregação ideológica, que consegue ser inserida até em exercícios de
matemática e física.
O preço da
liberdade, como diz o ditado, é a eterna vigilância: começou-se a
questionar projeto de hegemonia da esquerda moderna, mas sua influência e
infiltração na sociedade são profundos e duradouros, e a isso é
necessário, sempre, estar atento. Por isso é alentador que haja tantos
alunos e pais de alunos contrários às “ocupações” e tentando
restabelecer a normalidade da rotina escolar, embora o prejuízo almejado
pelos manifestantes já tenha sido, em parte, atingido com o
cancelamento parcial do ENEM. Seja como for, há esperança; esperança
suficiente para não permitir a ascensão do totalitarismo moderno que, há
décadas, se disfarça de ingênua boa intenção.
Thiago Pacheco é advogado, pós graduado em Processo Civil e formado em jornalismo. Escreve no Implicante às quintas-feiras.
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