sexta-feira, 24 de junho de 2016

Populistas são idiotas

24 de Junho de 2016

Por Mario Sabino
O populismo de esquerda e direita é capaz de infectar até mesmo países altamente civilizados, caso do Reino Unido. O Brexit representou uma vitória do populismo de direita, cujo rosto é Nigel Farage, chefe do Independence Party.
Os motores do Brexit foram principalmente a crise migratória e a xenofobia dos mais velhos -- os britânicos com menos de 24 anos votaram maciçamente pela permanência do Reino Unido na União Europeia. O excesso de regulação dos burocratas de Bruxelas contou para o “Leave”, mas serviu como força auxiliar para a decisão que causou um terremoto nas bolsas de todo o mundo e lançou uma sombra sobre o processo de globalização.
O populismo é o exato oposto da racionalidade, demonstra o Brexit. Como escreveu David Cassidy, da “New Yorker”, os seus partidários não ouviram a City, o ministro das Finanças, o Banco da Inglaterra, o FMI, o governo americano e uma infinidade de grandes economistas e empresários. Ao contrário do que diz toda essa gente respeitável, os adeptos do “Leave” acreditam que o Reino Unido poderá se tornar uma Noruega ou uma Suíça, países que rejeitaram a integração com o bloco, mas se beneficiam de um status especial com as nações da UE.
É um engano. A economia do Reino Unido, além de ser bem maior do que a norueguesa e suíça, é baseada na exportação de manufaturados que perderão o acesso sem barreiras ao maior mercado do planeta. Mercado, aliás, que está para integrar-se ao americano. UE e Estados Unidos negociam a criação da maior zona de livre comércio do mundo -- e o Reino Unido ficará fora dela. Muito inteligente.
A massa ignara que votou pela saída do bloco europeu deixou-se levar pelo discurso estúpido de Nigel Farage e asnos do Partido Conservador, sem se dar conta de que a integração à UE foi determinante para tirar o país da recessão na década de 80 e empurrar ladeira acima a economia britânica nos anos que se seguiram. O thatcherismo não teria dado resultados tão espetaculares sem a adesão ao bloco, apesar de todas as bravatas da Dama de Ferro.
A burocracia da UE é exasperante? Sim. A adoção do euro, sem união fiscal, foi desastrosa? Sim. A crise iniciada em 2008 continua a bater forte, em especial no Sul do continente? Sim. Os tropeços, contudo, não apagam o fato de que o bloco europeu é um sucesso político -- amalgamou nações historicamente inimigas -- e econômico. Não há um país que tenha empobrecido por causa da UE. Ela propiciou e acelerou o enriquecimento de todos, absolutamente todos, que a integram. O Reino Unido não ficará pobre, mas enriquecerá menos no seu esplêndido isolamento. A queda do valor da libra é o sinal mais evidente do futuro britânico.
A saída da UE também causará um problemão interno. Escócia e Irlanda do Norte votaram majoritariamente na permanência do Reino Unido no bloco. Em 2014, no plebiscito que definiu que os escoceses continuariam ligados à Inglaterra, um forte argumento utilizado nesse sentido foi dado pela UE. Os principais líderes europeus afirmaram que, se a Escócia saísse do Reino Unido, ela dificilmente seguiria no bloco. Agora, a Escócia está fora da UE, por causa do atrelamento à Inglaterra. Escoceses já recomeçam a falar em independência, dessa vez para voltarem ao bloco. Na Irlanda do Norte, por seu turno, o Sinn Fein, o partido nacionalista, quer um referendo para uni-la à Irlanda, que ficou rica graças à UE.
A ironia, nota David Cassidy, é que o Reino Unido corre o risco de se esfacelar do ponto de vista político antes de se desligar do bloco europeu, processo que deve demorar alguns anos para completar-se.
Populistas são, acima de tudo, idiotas.

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