sexta-feira, 22 de julho de 2016

Quem tem medo do Escola sem Partido?



O analfabetismo funcional é endêmico e Brasil lidera em violência contra professores – mas os petistas se revoltam é contra uma tabuleta

Coluna_Cede

A petezada está em polvorosa com o Projeto de Lei 193/2016, que inclui nas diretrizes da educação nacional ideias do Escola sem Partido.



Desde o impeachment de Dilma nunca vimos os petebas tão assustados. Leonardo Sakamoto, invertendo completamente a questão, teme “uma geração de zumbis”. Em seu texto, ele não cita o número do PL nem sequer a palavra “Senado”, talvez considerando o projeto uma espécie de Voldemort que não deve ser nomeado. André Gravatá, também blogueiro do UOL, responde à pergunta “[p]or que é importante votar contra o Escola Sem Partido?”. 



O ex-chefe do MEC Renato Janine, chamado para o cargo pelo grande mérito de não ser Cid Gomes e preterido em favor de Aloizio Mercadante seis meses depois, é outro que embarcou na cruzada, em entrevista concedida ao (quem mais?) UOL. Outros tantos blogs e revistas menos limpos, para os quais a higiene manda não linkar, também convocam a militância a lutar contra mais essa terrível iniciativa que ameaça o projeto de poder deles.


Vamos esclarecer algumas coisas neste debate:

1. Os petebas não estão nem aí para a educação


De janeiro de 2003 até abril deste ano, o Ministério da Educação foi ocupado por quem um presidente do PT decidisse. De lá para cá tivemos alguns avanços importantes, mas a qualidade do ensino continua sofrível. Dos 2,7 milhões de alunos brasileiros de 15 anos avaliados em 2012 pelo Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) da OCDE, 1,9 milhão tinha dificuldades em matemática, 1,4 milhão em leitura e 1,5 milhão em ciências. Em um ranking de 64 países, o Brasil ficou em 59º lugar em matemática e 60º em leitura e em ciências. Nas notas do Ideb, os resultados também estão bem atrasados.


Isso sem falar em aspectos para além das notas. Segundo a OCDE, o Brasil é líder mundial em agressão a professores. Quem visitar escolas públicas hoje tem grandes chances de ver pichações, janelas quebradas, alunos fora da sala de aula e consumo de drogas. Não è à toa que a escola em que a PM de Manaus tomou controle faz tanto sucesso.



O analfabetismo funcional é endêmico. De acordo com o Instituto Paulo Montenegro e a ONG Ação Educativa, apenas 8% das pessoas em idade de trabalhar são plenamente alfabetizadas. As mesmas organizações concluíram que 38% dos universitários brasileiros são analfabetos funcionais (o que não surpreende quem já visitou um DCE).



Em vez de cumprir uma agenda básica – cobrar que nossas crianças aprendam a ler, escrever e a fazer contas – a militância de sempre quer apenas ensinar nossas crianças a “lacrar”. Cobram uma quantidade cada vez maior de conteúdos nos currículos. Fazem das escolas centros de recrutamento para protestos do tipo “Fora Alckmin”. 



Aplaudem os temas do Enem. O fato de que milhões de estudantes não entendam o que estão lendo é um mero detalhe. Porque o importante na educação não é que os alunos sejam capazes de avaliar, esclarecer, comparar, aprofundar, etc; para os petebas, a escola é antes de tudo uma colônia de potenciais zumbis para gritar “não vai ter golpe”. Na qual o importante é ter “pensamento crítico”, desde que nunca crítico ao PT!



É absolutamente notável que para a petezada a maior ameaça à educação seja o Escola Sem Partido, e não a violência cotidiana contra os professores.

2. Para assuntos de interesse público, cabe a lei


Escolas públicas são pagas com dinheiro público e seus professores são funcionários públicos. Portanto, o funcionamento das escolas é de interesse público, da mesma forma que o funcionamento do SUS, da polícia, das estradas, etc.


Isso significa que a petezada não tem monopólio sobre como as escolas funcionam ou deveriam funcionar.


Entendo as críticas de alguns reaças ao projeto de lei: uma lei não vai mudar o jeito de um professor marxista dar aulas, o ideal é haver cobrança dos pais dos alunos, outros tantos podem preferir o homeschooling, a lei em si não muda o currículo ou as questões que caem no Enem, etc. Tudo isso é verdade. Mas o que o PL em questão pede, em essência, é colocar uma tabuleta nas escolas. Isto vai trazer o debate sobre o direito dos alunos a conhecerem perspectivas diferentes diretamente para dentro das mais de 200 000 escolas do Brasil. E isso não é pouco.

3. Lei não resolve problema de política pública


Nós brasileiros temos um problema cultural de querer resolver com leis problemas de política pública. Leis sobre moradia, saneamento básico e (principalmente) segurança pública estão aí para provar sua eficácia. A educação no Brasil é um problema de política pública e não será “resolvida” com uma lei. Mas a lei é um começo.


Isto dito, toda lei precisa de manutenção. Em 2011, o colunista da VEJA Gustavo Ioschpe sugeriu que toda escola tivesse do lado de fora uma placa com sua nota no Ideb. A ideia virou lei em Minas. Em uma tradicional escola pública perto de minha casa, em BH, vi a tal placa ser instalada. Hoje no lugar existe apenas a estrutura, como um feioso outdoor vazio…


4. As escolas são mais um campo de batalha



Os petebas perderam muitas batalhas nos últimos anos. Lula governou como um faraó, perdendo apenas uma disputa importante no Congresso (a queda da CPMF). De lá para cá, muitos adversários ao petismo se estabeleceram. As listas de best-sellers são dominadas por nomes como Olavo de Carvalho, Reinaldo Azevedo, Diogo Mainardi, Leandro Narloch. O próprio Reinaldo é líder de audiência com seu programa na Jovem Pan. Movimentos anti-PT tomaram as ruas em quantidades nunca antes vistas no Brasil. Apesar de toda a resistência de todo o projeto de poder, Dilma sofreu impeachment. E temos a Lava Jato.


No Congresso, nas livrarias, na imprensa, em Curitiba e nas ruas, o projeto de poder do PT tomou várias pancadas nos últimos anos. Até alguns DCEs de universidades eles perderam. Eles agora sabem que neste momento precisam conservar o que acumularam de mais precioso: o domínio das mentes impressionáveis, a fonte e origem de seus asseclas, onde militantes disfarçados de professores reinam quase absolutos. O que mais temem é que os alunos sejam expostos a perspectivas diferentes, que comparem diferentes autores, que entendam que “pensamento crítico” inclui criticar o livro didático e o professor, que, enfim, cheguem às suas próprias conclusões. O sistema educacional (incluindo as universidades) é a rainha-mãe do projeto gramsciano do PT. Chegou a hora de desinfetar.


Cedê Silva é jornalista. Escreve muito poucas vezes no medium.com/@CedeSilva e pouco muitas vezes no twitter.com/CedeSilva. Escreve no Implicante às sextas-feiras.



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