25 de Julho de 2016
Por Mario Sabino
Um ex-amigo meu costumava dizer que eu era "para-raios de
maluco". Demorei a descobrir que ele também era maluco. Sou um
para-raios de maluco muito lento.
O meu ex-amigo dizia isso porque, mesmo sem motivo suficiente, um monte
de gente desconhecida gosta de me xingar. Não estou reclamando ou me
vitimizando. É uma constatação. Basta dar uma espiada na área de
comentários de O Antagonista. Sou mais xingado do que o Diogo e o
Claudio, até quando não sou o autor dos posts que provocaram a ira dos
leitores que partem para cima de mim. Até quando estou de férias me
xingam.
Duas delicadezas: ser chamado de ”socialista fabiano” e “careca”.
“Socialista fabiano”, acho eu, é porque vivo parte do tempo em Paris --
e, claro, todo francês ou simpatizante só pode ser socialista. Eu nem
sabia o que é ser “socialista fabiano”, porque não me interesso por esse
tipo de assunto, mas me senti compelido a fazer uma rápida pesquisa na
internet. Concluí que o socialismo fabiano é parecido com a
social-democracia. Se não errei na comparação, estou um tantinho à
direita. Um Gregório Duvivier me definiria “hidrófobo”, como fez hoje na
sua coluna na Folha de S. Paulo, em relação a colegas de jornal que não
partilham do seu esquerdismo.
Quanto a “careca”, bem, eu sou careca. A minha calvície começou aos 19
anos. Fui um careca precoce de verdade, ao contrário do lugar-comum
sobre calvície citado por Gustave Flaubert, no seu “Dicionário de Ideias
Aceitas”: “Sempre precoce, é causada por excessos da mocidade ou a
concepção de grandes ideias”. A ironia hormonal com a precocidade é
evidente e, até o século XIX, havia quem associasse calvície a
inteligência. Citei Flaubert, grande escritor francês, porque,
obviamente, sou “socialista fabiano.
No início da queda de cabelo, não escondi o incômodo. Você acorda com o
travesseiro cheio de fios soltos e, no banho, a sensação de perda é
literalmente palpável. Nunca passei, contudo, do shampoo de babosa para
tentar reverter um processo geneticamente inexorável. Seis meses depois
de começar a ficar careca, abandonei o shampoo de babosa e não me
preocupei mais com o assunto. Ser careca jamais me impediu de namorar
moças bonitas, o único dado que interessa. Não acho que é dos carecas
que elas gostam mais, mas tenho certeza de que a carência capilar
masculina está longe de ser uma preocupação feminina.
Ao me tornar quarentão, descobri que, quando você é jovem, a calvície o
envelhece; já quando você é velho, a calvície o rejuvenesce, se você
deixar bem curto o que lhe restou de cabelo. Eu deixo bem curto porque o
que me restou de cabelo cresce desigualmente -- a vantagem
rejuvenescedora foi um bônus. De qualquer forma, ela não me distancia em
demasia da minha idade real, 54 anos.
Hoje em dia, ninguém xinga outra pessoa de “perneta” ou “maneta”.
Deficiências físicas não devem ser apontadas, em especial para depreciar
alguém, porque é politicamente incorreto e talvez até renda processo.
Tendo a crer que, ao me chamarem de “careca”, os meus detratores têm a
sua revanche do politicamente correto, mas de forma segura -- apontam o
que julgam ser um defeito físico, sem correrem riscos sociais ou
judiciais. É uma bobagem, visto que a falta de cabelo não tem as
implicações da falta de um membro superior ou inferior.
Quem me xinga de “careca” também acredita, imagino, que eu tenho o metro
idêntico de quem fez implante, como Renan Calheiros e José Dirceu. Em
hipótese nenhuma faria implante, assim como também não pintaria o cabelo
se dispusesse de farta ou rala cabeleira, como Edison Lobão ou José
Sarney. Sou o exato oposto dessa gente, inclusive em matéria capilar.
Para finalizar, quero dizer que podem continuar me xingando. De
“socialista fabiano”, “careca” e o que mais for. Como não vejo nada
errado em quem é gay, sintam-se livres, ainda, para me chamar de "veado"
ou epítetos semelhantes. Uma das minhas poucas conquistas é não me
ofender mais com esse tipo de coisa. Aos meus detratores, ofereço uns
versinhos de Millôr Fernandes:
“Ontem hoje
E amanhã
O homem o cabelo parte
Parte o cabelo com arte
Até que o cabelo parte.”
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