domingo, 12 de junho de 2016

10 vezes em que o politicamente correto passou de todos os limites em 2016


Se você nunca viu pessoalmente, certamente já ouviu falar pelo menos alguma vez a respeito. Eles entopem as redes sociais diariamente com um vocabulário padronizado, repetindo lugares comuns e clichês anti-científicos, preocupados com microagressões, lugares de fala e discussões pseudosociológicas, com uma alta carga de imposição de sugestionabilidade às suas ideias e um senso de superioridade moral irrefreável. Sim, estou falando dos internacionalmente conhecidos social justice warriors (SJW), que aqui no Brasil você provavelmente conhece como guerreiros da justiça social.


Atuando com uma perspectiva caricata do progressismo, de forma destemperada e imatura, os justiceiros sociais constantemente ridicularizam discussões sérias sobre problemas reais – como o racismo, o machismo e a homofobia – ao transformá-las em discussões rasteiras, com um puritanismo histriônico e apelos emocionais sem qualquer razoabilidade. Ao exagerar, incapazes de acolher qualquer crítica e preparados para apontar o dedo à mínima possibilidade de oposição, mais afastam do que aproximam as pessoas das pautas que julgam defender, não raramente servindo de palanque para políticos com bandeiras absolutamente opostas, transformando debates importantes em meros problemas de classe média – e criando conceitos esdrúxulos de livre expressão, categorizando quem pode falar a respeito do quê.



O efeito imediato? A criação de um constante clima policialesco politicamente correto que invade diferentes áreas da atividade humana, fazendo com que tudo seja encarado de forma entediantemente ofensiva. Quer alguns exemplos? Fiz uma lista de situações em que o politicamente correto passou dos limites nos últimos meses. Tem outros exemplos pra lembrar? Seu lugar de fala está garantido na seção de comentários logo abaixo.

1. O vilão que só pode agredir personagens masculinos.

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Eu poderia apostar que você leu essa notícia recentemente. Nem Apocalipse, um dos maiores vilões da história das histórias em quadrinho, com mais de cinco mil anos de idade, que já foi considerado deus por muitas civilizações, possui uma ampla gama de poderes, é imortal, um dos seres mais inteligentes do universo, já derrotou o Conde Drácula (duas vezes!) e é uma das figuras mais temidas do universo Marvel, conseguiu escapar das garras do politicamente correto. E tudo isso por conta de um cartaz onde o vilão asfixiava a personagem Mística, interpretada por Jennifer Lawrence, no último filme da franquia “X-Men”.


O burburinho começou pelas redes sociais. E então se potencializou quando a atriz Rose McGowan decidiu criticar a produção:
“F***-se essa merda. Há um imenso problema quando as pessoas da 20th Century Fox acham que violência contra mulher é a melhor forma de divulgar um filme.”
Pois é. Toda maldade de uma das figuras mais vilanescas da série virou uma mera questão de machismo. E o que a Fox, a responsável pelo filme, fez? Pediu desculpas, claro.
“Em nosso entusiasmo para mostrar a maldade do personagem Apocalipse, não percebemos de imediato a conotação perturbadora desta imagem”, disse o estúdio num comunicado divulgado nos Estados Unidos. “Assim que percebemos o quão indelicada ela era, rapidamente tomamos medidas para remover todo o material. Pedimos desculpas pelas nossas ações e nunca apoiaríamos a violência contra as mulheres.”
Apocalipse atravessou cinco mil anos de história para ser finalmente derrotado pelos justiceiros sociais.

2. O casal interracial racista.



Se nem as figuras mais temíveis dos quadrinhos conseguem escapar do politicamente correto, quem dirá a indústria da moda. Constantemente alvo de críticas, modelos, estilistas, donos de agência e publicitários são figuras carimbadas no universo dos justiceiros sociais. E na nova campanha da Versace, uma das maiores grifes do mundo, o combate se repetiu.


Repare na imagem acima. O que você consegue visualizar? Na peça, uma mãe branca e loira (a modelo Gigi Hadid, de 21 anos), caminha tranquilamente pelos bairros de uma cidade qualquer com seus dois filhos, negros, e seu marido, igualmente negro. Eis uma peça de publicidade inclusiva, onde pessoas de etnias diferentes formam uma família moderna, sem preconceitos – você deve estar pensando, certo? Repare novamente. A imagem causou comoção nas redes sociais (sempre elas!). E o motivo? Racismo.
“Por favor, retirem esse anúncio da Versace, é constrangedor. O anúncio inteiro é focado na mãe de pele clara. Tanto as crianças como o pai olham para ela impressionados. As minorias são pouco representadas na indústria e, quando em comerciais, elas são quase SEMPRE retratadas na sombra de uma modelo de pele clara”, disse uma usuária do Instagram.
Outro usuário comentou
“Por que há uma corrente em torno da menina negra que claramente não se mistura nessa foto bizarra?”
Talvez porque a personagem em questão seja um bebê, que está num carrinho de bebê, com um cinto de segurança de plástico para bebês? Será possível?


E não pense que os personagens foram os únicos problemas vistos como racistas na campanha. Há algo equivocado também com o background. Para os justiceiros sociais, a escolha do cenário, Chicago, não foi vista com bons olhos. E a razão: o fato da cidade sofrer uma onda de violência que afeta, de modo especial, a população negra.


Pensem nisso quando produzirem alguma peça no Rio de Janeiro, publicitários. Vocês podem ser acusados de racismo também.

3. O super herói que é viril demais.

Ele é o Capitão América, um símbolo dos militares americanos e um dos maiores super heróis de todos os tempos. Foi construído para derrotar alguns dos vilões mais temíveis do eixo do mal graças a um soro que lhe torna quase indestrutível ao lhe permitir atingir o ápice do condicionamento físico humano. Mas até ele possui um ponto fraco: sua virilidade heterossexual. Essa é, ao menos, a opinião da colunista Joanna Robinson, da revista americana Vanity Fair.


Joanna diz que saiu desapontada com o terceiro filme da saga do super herói, Guerra Civil, lançado em maio nos cinemas americanos. O motivo? Uma cena em que o Capitão se torna nostálgico ao relembrar suas corridas atrás de rabos de saia com seu melhor amigo, “Bucky” Barnes. Para a colunista, os diretores entregam evidências demais de que não há um relacionamento gay entre os amigos. E isso é um erro.

“É um momento doce e humano que os conecta, mas também é regado de virilidade heterossexual. Se a Disney não está inclinada a dar ao público um herói gay, ela não poderia pelo menos ter deixado para nós o sonho de Bucky com o Capitão?

O filme Capitão América: Guerra Civil não saiu da linha quando “definiu” o relacionamento de Bucky e Steve quando o Capitão dá um beijo em Sharon Carter (Emily VanCamp), enquanto Bucky olha de forma positiva para os dois? Onde está o espaço para a interpretação nesse momento?”

Sem qualquer passado gay, nem qualquer indício disso, nos cinemas ou nas histórias em quadrinhos, nem o Capitão América consegue escapar do fato que até a sua virilidade pode ser politicamente incorreta.

4. Os estudantes que protestam contra as aulas de inglês porque há muitos poetas homens e brancos na língua inglesa.

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Na Universidade de Yale, nos Estados Unidos, estudantes de inglês enviaram uma petição ao departamento do curso. O pedido é categórico: querem a retirada do estudo dos “grandes poetas ingleses” nas matérias introdutórias que servem de pré-requisito para outras disciplinas. A razão? O fato de que eles são escritores brancos do sexo masculino.

“É inaceitável que um estudante de Yale que queira introduzir-se na literatura inglesa deva ler apenas autores brancos do sexo masculino”, diz a petição.

Em Yale, os alunos têm de estudar Geoffrey Chaucer, Edmund Spenser, William Shakespeare e John Donne no semestre do outono e, então, John Milton, Alexander Pope, William Wordsworth e TS Eliot, no semestre da primavera. De acordo com o texto, priorizar esses escritores cria uma cultura “especialmente hostil aos estudantes de cor”. Com essa escolha, apontam os alunos, a universidade não prepara seus estudantes para fazerem estudos “de alto nível relativos à raça, sexo, sexualidade, etnia, nacionalidade”.


Um das figuras por trás do protesto é Adriana Miele, uma estudante que em abril escreveu um artigo de opinião onde criticava o curso porque nele os estudantes “são ensinados a analisar obras literárias canônicas”, mas “não são ensinados a questionar por que é que são canônicas, ou as implicações das obras canônicas que oprimem e marginalizam as pessoas não-brancas, mulheres, trans e gay”. Para ela, “é possível tirar uma licenciatura em língua inglesa apenas lendo autores homens e brancos. Muitos estudantes não leem uma única autora mulher em duas disciplinas fundamentais do curso”.


Catherine Nicholson, a professora responsável por ensinar a matéria dos “grandes poetas ingleses”, elogiou o questionamento dos alunos, mas defendeu que a disciplina em si, pelo conhecimento que carrega, não é uma ferramenta de exclusão, mas um exercício de “resistência e libertação”.


Na petição, que segundo o Yale Daily News até o final de maio já contava com 160 assinaturas (num universo de 200 estudantes), os alunos pedem para “que os grandes poetas ingleses sejam abolidos” do curso.


Quase cinco séculos depois de ter revolucionado a literatura ocidental, nem William Shakespeare escapa dos justiceiros sociais.

5. O país que quer mudar a letra do hino para um gênero neutro.


Desde o ano passado, quando assumiu o cargo de primeiro-ministro no Canadá, Justin Trudeau vem se tornando o mais novo ídolo dos justiceiros sociais ao redor do mundo. E não sem razão. Traudeau é uma espécie de Mujica canadense que conquistou parte do eleitorado de seu país com bandeiras que incluem a legalização da maconha, mais impostos para os ricos e uma nova relação com os índios.


Mas não pense que isso tudo é o bastante. Agora o seu partido tem outra tarefa em mente: neutralizar o gênero no hino nacional.


Há poucos dias, a esmagadora maioria do parlamento canadense (279-79) decidiu votar a favor de neutralizar o gênero na letra do hino do país, substituindo a linha “True patriot love in all thy sons command” (“Verdadeiro amor patriota, em vossos filhos comanda”) por “all of us command” (“em todos nós comanda”).


Uma proposta semelhante já havia sido apresentada em 2010, mas foi rejeitada pelos conservadores, que detinham a maioria no Parlamento.


Para o progressista Mauril Bélanger, que apresentou o projeto de lei há poucos meses, a alteração é significativa.
“Na véspera do 150º aniversário da nossa federação, é importante que um de nossos símbolos nacionais mais reconhecidos e apreciados reflita os progressos realizados pelo nosso país em termos de igualdade de gênero.”

A medida é uma vitória para os justiceiros sociais, acostumados a apontar problemas típicos de classe média com soluções pretensiosas que fingem mudar o mundo.

6. A brasileira que foi assaltada, levou um tiro e pediu desculpa aos bandidos porque eles “são vítimas” também.

Ela se chama Mariana Däffner. É brasileira, tem 22 anos e é esgrimista, atleta do Esporte Clube Pinheiros, em São Paulo. Há poucos dias, ao estacionar o carro da família nos arredores do bairro Menino Deus, em Porto Alegre, Mariana foi acometida por um desses problemas que afetam milhares de brasileiros todos os anos, entregues ao completo abandono da segurança pública no país: um assalto.
“Eles pediram pela chave do carro e eu entrei em pânico. Não sabia o que fazer, congelei. Comecei a procurar pela chave nos bolsos, mas não a encontrava. Eles estavam armados e me ameaçavam, diziam para eu não gritar. Eu não achava a chave para entregar e comecei a gritar. Nesse momento, eles procuraram a chave, não a acharam, levaram meu celular e foram embora. Na fuga, um dos caras atirou. O tiro atravessou o meu braço e passou de raspão na minha barriga. Gritei por socorro, algumas pessoas vieram me socorrer e encontraram a chave. Estava no porta-malas mesmo.”

Após passar por duas cirurgias, colocar uma haste e dez parafusos no braço, e lidar com o trauma de ver a sua vida no absoluto controle de alguns assaltantes, Mariana concedeu uma entrevista ao Zero Hora.


“Qual a sensação que fica desse episódio?


De descrença, de não acreditar que aconteceu comigo. Só me dei conta que havia sido assaltada e levado um tiro quando estava no carro da Brigada Militar e olhei para a minha mão. Tento não pensar na questão da criminalidade, da impotência e da vulnerabilidade que temos como cidadãos. Tento pensar na sorte que tive no meio desse episódio de total azar.


Você diria alguma coisa aos rapazes que lhe assaltaram?

Só consigo pensar em desculpas. Eu sinto muito, porque, infelizmente, o que aconteceu comigo é reflexo da sociedade em que vivemos.


Você gostaria de pedir desculpas a eles?
Sim.

Por quê?
Porque assim como fui vítima, eles são vítimas de tudo que vivemos hoje. É muito frustrante passar por uma situação como essa e ver que as pessoas se colocam nessas posições para sobreviver.


Você não sente raiva, então.
Não.”
E o que mais poderia sentir? No mundo orwelliano construído pelos justiceiros sociais guerra é paz, liberdade é escravidão e ignorância é força. 

7. Os alunos que pedem uma nota mínima garantida pela universidade para dedicarem mais tempo ao ativismo.


Com tanta coisa pra ajustar no mundo, tantas causas para militar, tantas questões para problematizar, os estudos evidentemente acabam se tornando um grande fardo na vida dos justiceiros sociais. Simplesmente não há tempo. Foi pensando nisso que os estudantes da Oberlin College, uma instituição privada historicamente reconhecida como progressista, estão assinando uma petição para proibir os seus professores de darem notas inferior a C (o equivalente a uma nota entre 6 e 7,9) aos seus alunos. A justificativa? Eles estão se atrapalhando nos estudos porque dedicam muito tempo a participar e organizar protestos. 


A petição já recebeu mais de 1.300 assinaturas até o momento.


Segundo a New Yorker, Oberlin é o centro da tempestade atual de ativismo em campus universitários, com os alunos fortemente envolvidos em questões como a diversidade em sala de aula, a desigualdade racial e a injustiça social. 


No final do ano passado, a Black Student Union lançou uma lista de 50 “demandas institucionais” para a universidade, entre elas pagar $ 8,20 por hora para os estudantes negros que organizam protestos. No documento, com 14 páginas, a organização diz que a Oberlin College “funciona nas premissas do imperialismo, da supremacia branca, do capitalismo, do capacitismo e do heteropatriarcado cissexista”.


A educação possui oficialmente uma nova função por lá. E ela definitivamente não é passar conhecimento adiante.

8. O aplicativo (para iPhone, claro) que divide a conta do restaurante pela dívida histórica. Homem branco paga mais.


Você já ouviu falar no termo dívida histórica, não? A ideia por trás desse conceito diz que uma população do presente deve pagar pelas injustiças que as populações do passado cometeram. Segundo ela, todos nós estamos inseridos nessa conta. Alguns em dívida, outros em crédito. Como estabelecer um resultado justo? Com ações afirmativas. Cotas, por exemplo. Há décadas elas vêm sendo defendidas através desse conceito.


Mas e se tudo isso ainda for pouco? Há algo que possa ser feito em outras situações banais, do cotidiano? Como, afinal, um justiceiro social pode organizar o seu dia a dia a partir de critérios que equacionem a dívida histórica?


Foi pensando nisso que foi criado o aplicativo Equitable. A ideia é simples: dividir contas de restaurante com base no gênero e nas diferenças salariais raciais das pessoas presentes. Se você é um homem branco e está acompanhado de uma mulher negra, por exemplo, você já deve imaginar as consequências do aplicativo – é melhor preparar o bolso. Equitable fará você pagar mais no final da história. Se você é uma mulher asiática e está acompanhado de um homem, bingo. Você se deu bem. Ele irá pagar a maior parte por isso. O responsável por isso tudo? O racismo e o patriarcado.


De acordo com o site do aplicativo, Equitable ajuda a evitar a discriminação enraizada que existe em nossa sociedade. Ele não divide a conta igualmente – divide equitativamente. Você paga o que deve para equilibrar as diferenças salariais.


O aplicativo usa os dados do Bureau of Labor Statistics para calcular quem deve pagar o que no final do jantar, garantindo que aqueles com menos privilégios (leia-se: qualquer pessoa não-branca que não seja do sexo masculino) pague menos para comer.


A comediante americana Luna Malbroux é o cérebro por trás da ideia, que nasceu como piada e venceu o grande prêmio do 2016 Comedy Hack Day in San Francisco. O aplicativo, no entanto, foi levado a sério e desenvolvido – e você consegue baixá-lo na iTunes Store clicando aqui. Ele só serve pra quem tem iPhone, claro!


9. Os fieis católicos que estão proibidos de rezar em voz alta para não ofender refugiados muçulmanos abrigados na igreja.

É uma cidadezinha com pouco mais de vinte mil habitantes. Fica ao noroeste da Itália. Chama-se Ventimiglia. Nos últimos anos, passou a receber em torno de 50 refugiados muçulmanos todos os dias, interessados em atravessar o país para chegar à França, causando uma “situazione insostenibile”, nas palavras do prefeito da cidade. A Caritas, uma organização de caridade católica que se estende por toda Itália, acolhe diversos deles.


Nós já substituímos o altar com duas camas. Eu acho que essa é a missa mais bonita que esta comunidade pode celebrar nestes dias, conta o padre Rosario Francolino, de Palermo.


Nas igrejas de Ventimiglia a situação se repete. O cenário, no entanto, causa um incômodo no mínimo curioso. Como aponta a Agenzia Nazionale Stampa Associata, a principal agência de notícias da Itália, um grupo de paroquianos da Igreja de Santo Antônio, uma das nove paróquias da cidade, se surpreendeu quando voluntários da Caritas lhes disseram que não poderiam recitar o rosário em voz alta. O motivo: não causar incômodo aos imigrantes muçulmanos que estão abrigados ali. A situação atingiu o nonsense quando um padre levou fieis que reclamavam da situação para rezarem em outro lugar.

A bizarrice politicamente correta não é completamente nova no continente europeu. No final do ano passado, uma igreja evangélica alemã já havia retirado os bancos, o altar e o púlpito, bem como todos os símbolos que remetiam ao cristianismo, para abrigar refugiados muçulmanos sem ofendê-los. A ideia era fazê-los se sentir ainda mais bem-vindos na nova casa.


A próxima etapa? Alguém pensou em converter cristãos em muçulmanos também? Não seria nada muito absurdo frente ao novo cenário envolvendo os refugiados. Tudo para não ofendê-los, evidentemente.

10. Esse estudo que problematiza os problemas de matemática.

Ela se chama Anita Bright. É PHD, tem quase 20 anos de carreira e é membro do corpo docente do Departamento de Currículo e Instrução da Portland State University, nos Estados Unidos. Em abril, ela lançou um estudo, onde problematiza diversos problemas de matemática. Nele, analisa provas sob a ótima dos justiceiros sociais. Curioso pra saber como isso se dá? Saca só. 


“Exemplos de problemas matemáticos relacionados a viagens criam cenários que demandam tempo livre e renda disponível, em geral de uma fonte não-identificada, o que novamente representa a experiência da classe média e a retrata como sendo normal. O problema a seguir (Maletsky, E., 2002, p. 77b) é um exemplo típico:


“Dois estudantes de arte estão visitando Paris. Cada um deles compra uma entrada para o museu por $14. Cada estudante também compra um ingresso para conhecer a Torre Eiffel por $11 e um ingresso para um passeio de barco por $3. Quanto os estudantes gastaram no total? Explique.”
O que pode parecer superficialmente uma visita acessível a Paris é, na verdade, parte de um passeio por uma das cidades mais caras do mundo para turistas (TripAdvisor, 2012). Não há menção às inúmeras despesas adicionais envolvidas neste problemas (como passagem de avião, custo de estadia e refeições). 



Em vez disso, o problema é apresentado como se estudantes de arte passeando por Paris fosse uma situação perfeitamente natural. Apesar das informações que faltam ao contexto, o problema exige que os alunos pensem sobre gasto de dinheiro, incluindo para atividades que, se outro paradigma estivesse em ação, poderiam ser realizadas de graça – como arte. Além disso, não há nenhuma alusão aos impactos ambientais relacionados ao ato de viajar (viagens aéreas e o “passeio de barco” mencionado no problema).”


E não fica apenas nisso. Quer outro problema apontado pelo estudo?

Muitos outros participantes também identificaram problemas que, sem fazer menção direta, parecem aludir à raça ou maneiras racializadas de conhecimento e existência. Um exemplo comum é representado em problemas que focam em refeições, como este, que pode ser encontrado no livro Algebra 1 (Larson, 2010), com as seguintes instruções e informações:


“Você quer planejar um café-da-manhã nutritivo. É necessário que tenha 500 calorias ou mais. Certifique-se que suas escolhas ofereçam um café-da-manhã razoável. (p.371)


Bagel branco – 195
Cereal, 1 xícara – 102
Suco de maçã, 1 copo – 123
Suco de tomate, 1 copo – 41
Ovo – 75
Leite, 1 xícara – 150”


Em primeiro lugar, a forma como o problema está colocado sugere que um café-da-manhã consiste de opções, e que o leitor tem escolha entre o que selecionar para a refeição. Apesar disto poder ser a realidade para alguns estudantes, há também muitos outros que recebem refeições gratuitas ou com preço reduzido nas escolas e, por isso, não têm escolha no que é servido. 



Além do mais, este café-da-manhã é típico do que é consumido em lares americanos, apesar de, como foi apontado por um participante, ‘as pessoas realmente tomam suco de tomate no café-da-manhã?’ Foi notado que poucas opções parecem ser integrais (com a possível exceção do ovo e talvez do cereal). Em vez disso, a ênfase está em comidas processadas. Além disso, o que é enfatizado no problema não é o conteúdo nutricional, mas as calorias associadas com cada alimento. As instruções, usando as palavras ‘nutritivo’ e ‘razoável’, presumem alguma coletividade, acordos subentendidos do que estes termos devem realmente significar na prática. 



Finalmente, a inclusão de leite (presume-se que seja leite de vaca) na lista de opções para um café-da-manhã ‘nutritivo’ falha em reconhecer o fato de que a maioria da população do planeta (~60%) é intolerante à lactose (Itan, Jones, Ingram, Swallow, & Thomas, 2010), e são os brancos (pessoas de descendência europeia) que primariamente são capazes de digerir leite. Logo, ao considerar quem os autores tinham em mente quando escreveram este item, parece que o público-alvo eram crianças brancas de classe média.”

O mundo está ou não ficando completamente insano, afinal?




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