quarta-feira, 6 de julho de 2016

Excelente texto! Policiofobia ou Síndrome de Estocolmo coletiva, onde os indivíduos passaram a ter simpatia por seus algozes e odiar seus protetores, assim como ovelhas que odeiam cães pastores e sorriem simpáticas para os lobos que as devorarão.

Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Filipe Bezerra


A policiofobia é uma construção cultural que pode ser conceituada como a promoção sistemática do ódio, da aversão, do preconceito, do descrédito e da desmoralização dos profissionais de segurança pública do Brasil.

Ao contrário do que imagina o senso comum a policiofobia não é consequência da violência policial ante a população de periferia, e tampouco é uma resultante do período do regime militar. A população de periferia historicamente nunca teve voz e a maioria dos policiais de hoje sequer viveram ou tiveram alguma ligação direta com o período dos chamados “anos de chumbo”.

Ela é, na verdade, uma construção artificiosa e ideológica de setores da política, da mídia e da academia, e é propagada, em regra,  por indivíduos das classes média e alta que, no alto de suas torres de marfim,  nunca sofreram abusos ou violência de policiais.

Não se pode negar, entretanto, que em meio ao efetivo das polícias exista uma minoria de psicopatas, corruptos e demais espécies de bandidos de farda, mas ninguém deseja mais que estes sejam excluídos, processados e presos do que a grande maioria de policiais honestos e de bem que tem a sua reputação profissional maculada pelas transgressões e crimes dos maus policiais. 


Mas é importante dizer que em nenhum outro grupo profissional o todo é julgado pela parte através de uma maliciosa e sistemática campanha de desmoralização.

Não faz muito tempo em que a mídia brasileira abordava o trabalho policial se não de uma forma positiva, mas, pelo menos, de uma forma neutra que possibilitava ao homem comum fazer um juízo de valor solidário aos homens e mulheres que arriscam a vida nas ruas na nobre missão servir e proteger a sociedade. 



De uma hora pra outra fatos isolados começaram a ganhar destaque e serem superdimensionados. A grande maioria das ações policiais -  legítimas por natureza - passaram a ser solenemente ignoradas, de uma forma que hoje quase toda a cobertura  do trabalho policial na grande mídia é em forma de pauta negativa. 


As séries e filmes policiais que exaltavam a humanidade, o heroísmo e a bravura desses profissionais sumiram e hoje é praticamente impossível encontrar uma produção cultural onde o personagem policial tenha razão.

Como os militares voltaram para os quartéis após a redemocratização  a polícia passou a ser o bode expiatório preferido de pseudointelectuais da academia e da política que, para promoverem a “luta de classes” através de um revanchismo tardio e descabido, fomentam abertamente à tolerância( e o estímulo moral) ao banditismo e, por conseguinte, a criminalização da atividade policial legítima.

 

O produto cultural destas ações é a grande inversão de valores que produz hoje no país a enorme sensação de impunidade que fez explodir a criminalidade. 



Essa mentalidade que odeia a polícia “opressora” invadiu também o judiciário já nos bancos universitários, e os policiais foram empurrados assim para uma legalidade que, de tão estreita, virou uma espécie de corda bamba onde se o policial age é acusado de abuso e caso se omita é acusado de prevaricação. 

Operou-se a assim um verdadeiro desmonte do arcabouço jurídico de proteção à atividade policial. Hoje no Congresso Nacional, por exemplo, partidos políticos que sobrevivem da promoção do caos patrocinam projetos que querem acabar com auto de resistência e com o crime de desacato o que, se concretizado, sepultaria de vez a polícia e entregaria o Brasil de bandeja ao crime.

Em países de cultura sadia o heroísmo e a bravura da polícia é estimulada. Policiais que trocam tiros com bandidos perigosos são aclamados e valorizados, e não são raras as vezes que são promovidos por bravura pelas autoridades constituídas. 



No Brasil a mesmas ações resultam sempre numa presunção de culpabilidade de forma que é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um policial ter, por exemplo, uma legítima defesa putativa reconhecida pelo judiciário. Ao policial brasileiro é presumido quase sempre o erro, a má fé, o excesso, o abuso e, muitas vezes, o crime.
Abandonados pelo estado e escutando apenas a parte esquizofrênica da sociedade que os condena, os policiais ficaram entregues à própria sorte e, por isso, são jogados à omissão.

 

O fomento da desmoralização da polícia ante a população menos letrada produziu também um paradoxo: se a polícia é violenta, ela deveria provocar medo e respeito na população e na criminalidade. 


Não é o que acontece. Se multiplicam as ocorrências em que pessoas desrespeitam a figura dos policiais e avançam sobre eles, o que tem causado mortes e lesões dos dois lados. Num passado recente era inconcebível uma pessoa sã atacar um policial armado.

 

Ante esse quadro, a desumanização da figura do policial veio à reboque. É possível observar uma certa psicopatia no ar ao ver que a sociedade não demonstra nenhuma empatia com os operadores de segurança pública que tombam assassinados por marginais. 


É como se o discurso hegemônico de proteção ao banditismo e criminalização da polícia produzisse uma Síndrome de Estocolmo coletiva, onde os indivíduos passaram a ter simpatia por seus algozes e odiar seus protetores, assim como ovelhas que odeiam cães pastores e sorriem simpáticas para os lobos que as devorarão.

Não se combate a criminalidade vestindo camisas brancas e pedindo paz. 


Nenhum bandido  abandonará o crime e se tornará um trabalhador por causa disso. É preciso que a sociedade entenda em sua plenitude o velho adágio romano: si vis pacem, para bellum, que, nos dias de hoje, significaria: se queres paz, apoie a polícia. 


É preciso sustar o cheque em branco da impunidade e da hipocrisia e valorizar os soldados cidadãos que, ao fazer o enfrentamento direto ao crime, tentam devolver as ruas do país às pessoas de bem.


Filipe Bezerra é Policial Rodoviário Federal, bacharel em Direito pela UFRN, pós-graduado em Ciências Penais pela Anhaguera-Uniderp, bacharelando em Administração Pública pela UFRN e membro da Ordem dos Policiais do Brasil. Originalmente publicado no site novojornal.jor.br

Temer, modas de primavera - VINICIUS TORRES FREIRE

quarta-feira, julho 06, 2016



FOLHA DE SP - 06/07

Desastres novos à parte, Michel Temer deve roer o osso mais duro de seu governo apenas lá por setembro. Então é que se deve voltar a discutir o teto de gastos e a Previdência.

Até a primavera, Temer teria então trégua e tempo de apresentar medidas de animação do setor privado, as quais em tese devem compensar o ajuste fiscal que não virá em seu governo, mas no "longo prazo". Esse parece ser o núcleo do plano temeriano.

Nesta quinta (7), Temer e companhia passam o último vexame maior do primeiro bimestre de governo. Apresentam a meta fiscal para 2017, o deficit primário (receitas menos despesas, exceto gastos com juros).

O rombo previsto será grande. O governo será acusado outra vez de relaxamento, mas não há sinal de debandada da elite: críticas abertas de gente de peso ou tumulto nas projeções e nos preços do mercado.

Ainda assim, será vexame e gasto do crédito que o governo Temer recebeu. Para não pegar mal, não deve vir quase nada de aumento de imposto (velho ou novo).

Há rumores de que o buraco nas contas federais deve ficar entre R$ 130 bilhões e R$ 170 bilhões, média de R$ 150 bilhões. A estimativa mediana no mercado anda pela casa de R$ 100 bilhões.

Ainda assim, o governo pode até mudar a lei de linhas gerais do Orçamento e a meta, que devem ser votadas depois de agosto. O Congresso entra em recesso branco na metade de julho. Até 21 de agosto, há a diversão da Olimpíada. No resto do mês, a provável deposição de Dilma Rousseff.

Nesses dois meses, o governo deve apresentar projetos que animem os donos do dinheiro grosso. Em escala menor, o plano, se é um plano, lembra um pouco o governo FHC 1.

Os superavit fiscais então eram minúsculos –não havia ajuste fiscal algum. O governo tinha, porém, o enormíssimo crédito de ter controlado a inflação e um programa de privatizações, de limpeza de esqueletos fiscais e de remoção de entulho burocráticos, um plano "amigo do mercado". Mesmo com as contas públicas em desordem, o país saiu do subsolo do buraco.

Nesta semana, o governo pretende aprovar a renegociação da dívida dos Estados, normas para limitar a farra podre nos fundos de pensão e desobrigar a Petrobras de tomar parte em todas as explorações do pré-sal.

A seguir, a ideia é tentar limpar alguma parte do entulho burocrático que dificulta a vida das empresas (grátis e consensual) e, mais complicado, flexibilizar a lei de licitações e os licenciamentos de obras de infraestrutura.

Pretende-se anunciar privatizações na área de energia, dos seguros da Caixa e do IRB, alguma definição sobre o financiamento das concessões de infraestrutura e alguma receita para diminuir a ruína das estatais maiores (Petrobras e Eletrobras).

É o que dizem, pelo menos: mudanças "nada traumáticas" que diminuam o "custo de fazer negócios" no país, como diz o chavão.

O programa não será de grande utilidade, porém, se não vierem o teto e uma reforma da Previdência.

A praça está engolindo a seco a perspectiva de deficit primários enormes até pelo menos 2018. Mas, se não houver perspectiva, "regras fiscais", para tapar o rombo no médio prazo, tudo desanda. Para começar, os juros não caem. O recomeço do futuro ficaria adiado para 2019.


A alternativa - ROSÂNGELA BITTAR

quarta-feira, julho 06, 2016



Valor Econômico - 06/07

Existe apenas uma alternativa ao governo Michel Temer: é o governo Dilma Rousseff. O processo de desestabilização aplicado ao governo interino tem feito questão de desconhecer essa realidade. Estão ambos em campanha para que, em agosto, o Senado Federal diga qual dos dois vai comandar o país.

O governo Dilma é mais do que conhecido. Nesses dois meses de gestão na interinidade, Temer se deu a conhecer. Conseguiu muito: estabelecer uma base mais fiel no Congresso, fixar a meta de resultado fiscal para este ano e o próximo (o que deve acontecer a qualquer momento esta semana), aprovar a desvinculação de receitas, formular uma política fiscal com base no teto de gastos e aguardar pela sua aprovação negociada, conseguir do Congresso a realização de votações para liberar reajustes concedidos e represados há oito meses, promover a correção do programa símbolo Bolsa Família, recompor uma equipe de excelência para gestão da economia, aí incluídos dirigentes de estatais e bancos públicos que pudessem devolver segurança no manejo do elevador de subida, renegociar a dívida dos Estados e tocar o dia a dia junto com a sombra da Operação Lava-Jato, que incapacita os governos de qualquer partido à tranquilidade. É um senhor saldo. O clima negativo mudou um pouco, esmaeceu a opacidade e a paralisia incapacitante parece ter ficado para trás.

Há, então, esse governo de dois meses incompletos, e há o da Dilma, de 17 meses anteriores a maio, com um saldo menor e crise política, econômica e moral equivalentes. Depois de agosto, ou é um, ou é o outro. Arquivem-se ideias mirabolantes do arsenal de recursos para manter o poder, tais como uma nova eleição agora, um plebiscito, ou qualquer invencionice que, neste momento, se apresente como alternativa.

Essa é a realidade da política, de um governo político, de uma democracia representativa, de nível e gosto duvidoso, porém não importa, é este o Congresso que há e, a julgar pela evolução da história da política brasileira, o próximo será seguramente pior.

Portanto, melhor seria se o multifacetado mercado, que não é um, mas são muitos, dominados por diferentes tipos de forças e pressões - há o financeiro, doutor em manobrar a crise, há o produtivo, insulado pelo colapso do consumo, há o dos negócios da infraestrutura, sem o qual não há crescimento e emprego - fosse tratado como tal, um jogo, que não inclui entre suas regras a paciência, a persistência, e a criatividade nas soluções.

O que prevalece nele é a falta de imaginação e a pressa. Tecnocratas que voltam a repetir o mesmo que disseram em todas as crises de todos os governos, os conceitos vagos, as saídas de sempre, ao ônus das mesmas presas fáceis de sempre. Do governo Temer, cobra-se, hoje, um plano pronto e acabado e zero de experiências e negociações políticas, antes mesmo de se tornar definitivo. Se entregar o que pedem, não se tornará.

Empossada com pompa uma equipe econômica de excelência não porque o mercado o exigia, mas porque o país precisava de autoridade para formular um projeto e reverter a sua queda vertiginosa abismo adentro, enquanto no plano político havia boa tensão para dar solidez ao governo a seguir adiante. Desta equipe se está a exigir, agora, 50 dias depois, o resultado de uma vida.

Do caminho percorrido até aqui não brotam milagres, menos ainda do que é preciso seguir nos próximos dois anos, seja com que gestão for. O governo em ação é interino, vale lembrar a todo momento, precisa da confirmação dentro de um mês e é a política que o comanda, embora seja admirável o grupo que conseguiu nomear no seu projeto para a economia.

São muitas as tentativas de desestabilizá-lo, mas está aí um governo que acredita na política, na interação entre os Poderes Executivo e Legislativo, principalmente, num momento em que o Judiciário está às voltas com a liderança firme do combate à corrupção, mal que gravou todos os Poderes, em especial os Executivos do PT e do PMDB, titulares dos governos em disputa. A realidade exige prosseguir nesta guerra e governar lado a lado com a Operação Lava-Jato.

Para manter o país funcionando, fazer política é preciso. Inaceitável, por exemplo, que o presidente em exercício, Michel Temer, anuncie constrangido que vai tomar, no futuro, medidas impopulares. Uma substituição de um governo por outro não pode ser uma sucessão de falta de originalidade. Temer faz uma ameaça à sociedade. Se as medidas são impopulares, como aponta, por que adotá-las? Se o são, não as faça. Para que punir o cidadão? Não tem mais de onde tirar soluções a não ser do assalariado? O governo tem obrigação de ser generoso.

Temer, no seu mais recente discurso, aceitou a corda para se enforcar. Essa equipe de alto nível, com Ilan Goldfajn, Henrique Meirelles, Mansueto de Almeida, Carlos Hamilton, Pedro Parente, Silvia Bastos, José Serra, Paulo Caffarelli, não conseguirá inventar uma nova política? O crescimento só se fará com as dores do povo?

Juscelino Kubitschek, o exemplo de democrata para os governos pós ditadura militar, sempre vencendo a comparação com qualquer outro, foi criticado por ambíguo, contraditório, e conseguiu compatibilizar a, digamos simbolicamente, plutocracia paulista com a panela de pressão da esquerda, sem descuidar da classe média.

A política de desenvolvimento é feita de contradições e ambiguidades necessárias. O mercado não é monolítico, a sociedade também não, a política menos ainda. Não leva a nada contrapor um ao outro. A ruptura, no Brasil de hoje, acabou ficando inaceitável.

Aponte-se o dirigente de maior sucesso hoje, no mundo, e identifique-se o que o move. O Papa Francisco deve seu destaque ao rompimento com a inflexibilidade ou não? Não está tergiversando com a moral, com os costumes, com a fé, mas reconhecendo as situações de fato e enfrentando-as com bom senso.

O torniquete que se quer impor a um governo que prefere agir politicamente está viciado, representa interesses específicos que talvez não sejam o bem comum. Não é momento de aplicar teorias, mas de ter proposta para pessoas reais. Um governo necessário precisa coragem para contrariar velhos modelos.

Se ficar, por sucessão constitucional, o governo Temer tem que estar preparado para apresentar seu caminho depois de agosto. E Dilma Rousseff, em lugar de estar brincando de guerrilha, inclusive internacional, deveria debruçar-se sobre seu plano de condução do país para os dois anos finais até a próxima eleição presidencial. Senão não se sabe para quê quer voltar. Só existem os dois governos, e um é a alternativa ao outro.


Paradoxo de Chaui – UIRÁ MACHADO



Folha de SP - 06/07

Marilena Chaui não é o dr. Simão Bacamarte, mas, assim como o personagem inventado por Machado de Assis, a certa altura da vida passou a enxergar no mundo somente dois tipos de pessoa.

Para o médico de "O Alienista", havia os loucos e os sãos; para a professora de filosofia da USP, há os defensores intransigentes dos governos petistas e os inimigos do Brasil. Entre as categorias, nenhuma nuance.

Quando Bacamarte decidiu levar suas ideias ao extremo, ampliando desmesuradamente o território da loucura, quatro quintos da população de sua Itaguaí terminaram enclausurados no manicômio local.

Quando Chaui faz o mesmo com suas teorias, o juiz federal Sergio Moro se transforma num agente treinado pelo FBI para desestabilizar o país e entregar o petróleo nacional às companhias norte-americanas.

"A Operação Lava Jato não tem nada a ver com a moralização da Petrobras", ensina a professora. "É para tirar de nós o pré-sal."

No maniqueísmo de Chaui, tudo que atinge a esquerda está a serviço da direita. O combate à corrupção não tem valor se afetar administrações do PT —pois integrará, nesse caso, um plano para debilitar os únicos defensores da soberania nacional. Foi assim durante o mensalão, é assim no petrolão.

Em vez de fomentar a autocrítica dentro do campo ideológico que representa, a autora do premiado "Convite à Filosofia" propõe discussões em torno de puros disparates. Com suas simplificações risíveis, Chaui, considerada uma referência intelectual, pouco ajuda e muito atrapalha a causa em que acredita.

No conto "O Alienista", após muito refletir sobre suas teorias, o médico curvou a cabeça e recolheu-se ele próprio ao manicômio. Marilena Chaui não é Simão Bacamarte, mas, se considerar bem o estrago que tem provocado na esquerda brasileira, talvez venha a acusar a si própria de estar a serviço da direita —sabe-se lá se treinada pelo FBI.