sábado, 17 de novembro de 2018

Os dez princípios do conservadorismo

Os dez princípios do conservadorismo
Os dez princípios do conservadorismo


O conservadorismo é um estado da mente, um tipo de caráter, uma maneira de olhar para a ordem social e civil. Eis aqui dez princípios gerais desse conjunto de opiniões, formulados pelo filósofo Russell Kirk.

Russell KirkTradução:  Padre Paulo Ricardo12 de Novembro de 2018

Não sendo nem uma religião nem uma ideologia, o conjunto de opiniões designado como conservadorismo não possui nem uma Escritura Sagrada nem um Das Kapitalque lhe forneça um dogma. Na medida em que seja possível determinar o que os conservadores crêem, os primeiros princípios do pensamento conservador provêm daquilo que professaram os principais escritores e homens públicos conservadores ao longo dos últimos dois séculos. Sendo assim, depois de algumas observações introdutórias a respeito deste tema geral, eu irei arrolar dez destes princípios conservadores.

Talvez seja mais apropriado, a maior parte das vezes, usar a palavra “conservador” principalmente como adjetivo. Porque não existe um Modelo Conservador, sendo o conservadorismo, na verdade, a negação da ideologia: trata-se de um estado da mente, de um tipo de caráter, de uma maneira de olhar para a ordem social civil.

A atitude que nós chamamos de conservadorismo é sustentada por um conjunto de sentimentos, mais do que por um sistema de dogmas ideológicos. É quase verdade que um conservador pode ser definido como sendo a pessoa que se acha conservadora. O movimento ou o conjunto de opiniões conservadoras pode comportar uma diversidade considerável de visões a respeito de um número considerável de temas, não havendo nenhuma Lei do Teste (Test Act) [1] ou Trinta e Nove Artigos (Thirty-Nine Articles) [2] do credo conservador.

Em suma, uma pessoa conservadora é simplesmente uma pessoa que considera as coisas permanentes mais satisfatórias do que o “caos e a noite primitiva” [3]. (Mesmo assim, os conservadores sabem, como Burke, que a saudável “mudança é o meio de nossa preservação”.) A continuidade da experiência de um povo, diz o conservador, oferece uma direção muito melhor para a política do que os planos abstratos dos filósofos de botequim. Mas é claro que a convicção conservadora é muito mais do que esta simples atitude genérica.

A continuidade da experiência de um povo oferece uma direção muito melhor para a política do que os planos abstratos dos filósofos de botequim.

Não é possível redigir um catálogo completo das convicções conservadoras; no entanto, ofereço aqui, de forma sumária, dez princípios gerais; tudo indica que se possa afirmar com segurança que a maioria dos conservadores subscreveria a maior parte destas máximas. Nas várias edições do meu livro The Conservative Mind (“A Mentalidade Conservadora”, ainda sem tradução para o português), fiz uma lista de alguns cânones do pensamento conservador — a lista foi sendo levemente modificada de uma edição para a outra; em minha antologia The Portable Conservative Reader, ofereço algumas variações sobre este assunto.

Agora, lhes apresento uma resenha dos pontos de vista conservadores que difere um pouco dos cânones que se encontram nestes meus dois livros. Por fim, as diferentes maneiras através das quais as opiniões conservadoras podem se expressar são, em si mesmas, uma prova de que o conservadorismo não é uma ideologia rígida. Os princípios específicos enfatizados pelos conservadores, em um dado período, variam de acordo com as circunstâncias e as necessidades daquela época. Os dez artigos de convicções abaixo refletem as ênfases dos conservadores americanos da atualidade.

Primeiro, um conservador crê que existe uma ordem moral duradoura. Esta ordem é feita para o homem, e o homem é feito para ela: a natureza humana é uma constante e as verdades morais são permanentes.

Esta palavra ordem quer dizer harmonia. Há dois aspectos ou tipos de ordem: a ordem interior da alma e a ordem exterior da comunidade. Vinte e cinco séculos atrás, Platão ensinou esta doutrina, mas hoje em dia até as pessoas instruídas acham difícil de compreendê-la. O problema da ordem tem sido uma das principais preocupações dos conservadores desde que a palavra conservador se tornou um termo político.

O nosso mundo do século XX experimentou as terríveis conseqüências do colapso na crença em uma ordem moral. Assim como as atrocidades e os desastres da Grécia do século V a.C., a ruína das grandes nações, em nosso século, nos mostra o poço dentro do qual caem as sociedades que fazem confusão entre o interesse pessoal, ou engenhosos controles sociais, e as soluções satisfatórias da ordem moral tradicional.

Foi dito pelos intelectuais progressistas que os conservadores acreditam que todas as questões sociais, no fundo, são uma questão de moral pessoal. Se entendida corretamente, esta afirmação é bastante verdadeira. Uma sociedade onde homens e mulheres são governados pela crença em uma ordem moral duradoura, por um forte sentido de certo e errado, por convicções pessoais sobre a justiça e a honra, será uma boa sociedade — não importa que mecanismo político se possa usar; enquanto se uma sociedade for composta de homens e mulheres moralmente à deriva, ignorantes das normas, e voltados primariamente para a gratificação de seus apetites, ela será sempre uma má sociedade — não importa o número de seus eleitores e não importa o quanto seja progressista sua constituição formal.

Segundo, o conservador adere ao costume, à convenção e à continuidade

É o costume tradicional que permite que as pessoas vivam juntas pacificamente; os destruidores dos costumes demolem mais do que o que eles conhecem ou desejam. É através da convenção — uma palavra bastante mal empregada em nossos dias — que nós conseguimos evitar as eternas discussões sobre direitos e deveres: o Direito é fundamentalmente um conjunto de convenções. Continuidade é uma forma de atar uma geração com a outra; isto é tão importante para a sociedade com o é para o indivíduo; sem isto a vida seria sem sentido. 

Revolucionários bem sucedidos conseguem apagar os antigos costumes, ridicularizar as velhas convenções e quebrar a continuidade das instituições sociais — motivo pelo qual, nos últimos tempos, eles têm descoberto a necessidade de estabelecer novos costumes, convenções e continuidade; mas este processo é lento e doloroso; e a nova ordem social que eventualmente emerge pode ser muito inferior à antiga ordem que os radicais derrubaram um seu zelo pelo Paraíso Terrestre.

Os conservadores são defensores do costume, da convenção e da continuidade porque preferem o diabo conhecido ao diabo que não conhecem.

Os conservadores são defensores do costume, da convenção e da continuidade porque preferem o diabo conhecido ao diabo que não conhecem. Eles crêem que ordem, justiça e liberdade são produtos artificiais de uma longa experiência social, o resultado de séculos de tentativas, reflexão e sacrifício. Por isto, o organismo social é uma espécie de corporação espiritual, comparável à Igreja; pode até ser chamado de comunidade de almas. 

A sociedade humana não é uma máquina, para ser tratada mecanicamente. A continuidade, a seiva vital de uma sociedade não pode ser interrompida. A necessidade de uma mudança prudente, recordada por Burke, está na mente de um conservador. Mas a mudança necessária, redarguem os conservadores, deve ser gradual e discriminatória, nunca se desvencilhando de uma só vez dos antigos cuidados.

Terceiro, os conservadores acreditam no que se poderia chamar de princípio do preestabelecimento

Os conservadores percebem que as pessoas atuais são anões nos ombros de gigantes, capazes de ver mais longe do que seus ancestrais apenas por causa da grande estatura dos que nos precederam no tempo. Por isto os conservadores com freqüência enfatizam a importância do preestabelecimento — ou seja, as coisas estabelecidas por costume imemorial, de cujo contrário não há memória de homem que se recorde.

 Há direitos cuja principal ratificação é a própria antiguidade — inclusive, com freqüência, direitos de propriedade. Da mesma forma a nossa moral é, em grande parte, preestabelecida. Os conservadores argumentam que seja improvável que nós modernos façamos alguma grande descoberta em termos de moral, de política ou de bom gosto. É perigoso avaliar cada tema eventual tendo como base o julgamento pessoal e a racionalidade pessoal. O indivíduo é tolo, mas a espécie é sábia, declarou Burke. Na política nós agimos bem se observarmos o precedente, o preestabelecido e até o preconceito, porque a grande e misteriosa incorporação da raça humana adquiriu uma sabedoria prescritiva muito maior do que a mesquinha racionalidade privada de uma pessoa.

A Providência se move devagar, mas o demônio está sempre com pressa.

Quarto, os conservadores são guiados pelo princípio da prudência.

Burke concorda com Platão que entre os estadistas a prudência é a primeira das virtudes. Toda medida política deveria ser medida a partir das prováveis conseqüências de longo prazo, não apenas pela vantagem temporária e pela popularidade. Os progressistas e os radicais, dizem os conservadores, são imprudentes: porque eles se lançam aos seus objetivos sem dar muita importância ao risco de novos abusos, piores do que os males que esperam varrer. 

Com diz John Randolph de Roanoke, a Providência se move devagar, mas o demônio está sempre com pressa. Sendo a sociedade humana complexa, os remédios não podem ser simples, se desejam ser eficazes. O conservador afirma que só agirá depois de uma reflexão adequada, tendo pesado as conseqüências. Reformas repentinas e incisivas são tão perigosas quanto as cirurgias repentinas e incisivas.

Quinto, os conservadores prestam atenção no princípio da variedade

Eles gostam do crescente emaranhado de instituições sociais e dos modos de vida tradicionais, e isto os diferencia da uniformidade estreita e do igualitarismo entorpecente dos sistemas radicais. Em qualquer civilização, para que seja preservada uma diversidade sadia, devem sobreviver ordens e classes, diferenças em condições materiais e várias formas de desigualdade. As únicas formas verdadeiras de igualdade são a igualdade do Juízo Final e a igualdade diante do tribunal de justiça; todas as outras tentativas de nivelamento irão conduzir, na melhor das hipóteses, à estagnação social. Uma sociedade precisa de liderança honesta e capaz; e se as diferenças naturais e institucionais forem abolidas, algum tirano ou algum bando de oligarcas desprezíveis irá rapidamente criar novas formas de desigualdade.


Sexto, os conservadores são refreados pelo princípio da imperfectibilidade

A natureza humana sofre irremediavelmente de certas falhas graves, bem conhecidas pelos conservadores. Sendo o homem imperfeito, nenhuma ordem social perfeita poderá jamais ser criada. Por causa da inquietação humana, a humanidade tornar-se-ia rebelde sob qualquer dominação utópica e se desmantelaria, mais uma vez, em violento desencontro — ou então morreria de tédio. Buscar a utopia é terminar num desastre, dizem os conservadores: nós não somos capazes de coisas perfeitas. Tudo o que podemos esperar razoavelmente é uma sociedade que seja sofrivelmente ordenada, justa e livre, na qual alguns males, desajustes e desprazeres continuarão a se esconder. 

Dando a devida atenção à prudente reforma, podemos preservar e aperfeiçoar esta ordem sofrível. Mas se os baluartes tradicionais de instituição e moralidade de uma nação forem negligenciados, se dá largas ao impulso anárquico que está no ser humano: “afoga-se o ritual da inocência” [4]. Os ideólogos que prometem a perfeição do homem e da sociedade transformaram boa parte do século XX em um inferno terrestre.

Sétimo, os conservadores estão convencidos que liberdade e propriedade estão intimamente ligadas

Separe a propriedade do domínio privado e Leviatã se tornará o mestre de tudo. Sobre o fundamento da propriedade privada, construíram-se grandes civilizações. Quanto mais se espalhar o domínio da propriedade privada, tanto mais a nação será estável e produtiva. Os conservadores defendem que o nivelamento econômico não é progresso econômico. Aquisição e gasto não são as finalidades principais da existência humana; mas deve-se desejar uma sólida base econômica para a pessoa, a família e a comunidade.

Sir Henry Maine, em sua Village Communities, defende vigorosamente a causa da propriedade privada, como diferente da propriedade pública: “Ninguém pode ao mesmo tempo atacar a propriedade privada e dizer que aprecia a civilização. A história destas duas realidades não pode ser desintrincada”. Pois a instituição da propriedade privada tem sido um instrumento poderoso, ensinando a responsabilidade a homens e mulheres, dando motivos para a integridade, apoiando a cultura geral e elevando a humanidade acima do nível do mero trabalho pesado, proporcionando tempo livre para pensar e liberdade para agir. Ser capaz de guardar o fruto do próprio trabalho; ser capaz de ver o próprio trabalho transformado em algo de duradouro; ser capaz de deixar em herança a sua propriedade para sua posteridade; ser capaz de se erguer da condição natural da oprimente pobreza para a segurança de uma realização estável; ter algo que é realmente propriedade pessoal — estas são vantagens difíceis de refutar. O conservador reconhece que a posse de propriedade estabelece certos deveres do possuidor; ele reconhece com alegria estas obrigações morais e legais.


As pessoas atuais são anões nos ombros de gigantes, capazes de ver mais longe do que seus ancestrais apenas por causa da grande estatura dos que nos precederam no tempo.


Oitavo, os conservadores promovem comunidades voluntárias, assim como se opõem ao coletivismo involuntário

Embora os americanos tenham se apegado vigorosamente aos direitos privados e de privacidade, também têm sido um povo conhecido por seu bem sucedido espírito comunitário. Na verdadeira comunidade, as decisões que afetam de forma mais direta as vidas dos cidadãos são tomadas no âmbito local e de forma voluntária. Algumas destas funções são desempenhadas por organismos políticos locais, outras por associações privadas: enquanto permanecem no âmbito local e são caracterizadas pelo comum acordo das pessoas envolvidas, elas constituem comunidades saudáveis. Mas quando as funções, quer por deficiência, quer por usurpação, passam para uma autoridade central, a comunidade se encontra em sério perigo. Se existe algo de benéfico ou prudente em uma democracia moderna, isto se dá através da volição cooperativa. 

Se, então, em nome de uma democracia abstrata, as funções da comunidade são transferidas para uma coordenação política distante, o governo verdadeiro, através do consentimento dos governados, cede lugar para um processo de padronização hostil à liberdade e à dignidade humanas.

Uma nação não é mais forte do que as numerosas pequenas comunidades pelas quais é composta. Uma administração central, ou um grupo seleto de administradores e servidores públicos, por mais bem intencionado e bem treinado que seja, não pode produzir justiça, prosperidade e tranqüilidade para uma massa de homens e mulheres privada de suas responsabilidades de outrora. Esta experiência já foi feita; e foi desastrosa. É a realização de nossos deveres em comunidade que nos ensina a prudência, a eficiência e a caridade.

A grande e misteriosa incorporação da raça humana adquiriu uma sabedoria prescritiva muito maior do que a mesquinha racionalidade privada de uma pessoa.

Nono, o conservador percebe a necessidade de uma prudente contenção do poder e das paixões humanas

Politicamente falando, poder é a capacidade de se fazer aquilo que se queira, a despeito da aspiração dos próprios companheiros. Um estado em que um indivíduo ou um pequeno grupo é capaz de dominar as aspirações de seus companheiros sem controles é um despotismo, quer seja monárquico, aristocrático ou democrático. Quando cada pessoa pretende ser um poder em si mesmo, então a sociedade se transforma numa anarquia. A anarquia nunca dura muito tempo porque é intolerável para todos e contrária ao fato irrefutável de que algumas pessoas são mais fortes e espertas do que seus próximos. À anarquia sucede-se a tirania ou a oligarquia, nas quais o poder é monopolizado por pouquíssimos.

O conservador se esforça por limitar e balancear o poder político para que não surjam nem a anarquia, nem a tirania. No entanto, em todas as épocas, homens e mulheres foram tentados a derrubar os limites colocados sobre o poder, a favor de um capricho temporário. É uma característica do radical que ele pense o poder como uma força para o bem — desde que o poder caia em suas mãos. Em nome da liberdade, os revolucionários franceses e russos aboliram os limites tradicionais ao poder; mas o poder não pode ser abolido; e ele sempre acha um jeito de terminar nas mãos de alguém. O poder que os revolucionários pensavam ser opressor nas mãos do antigo regime, tornou-se muitas vezes mais tirânico nas mãos dos novos mestres do estado.

Todas as questões sociais, no fundo, são uma questão de moral pessoal.

Sabendo que a natureza humana é uma mistura do bem e do mal, o conservador não coloca sua confiança na mera benevolência. Restrições constitucionais, freios e contrapesos políticos (checks and balances), correta coerção das leis, a rede tradicional e intricada de contenções sobre a vontade e o apetite — tudo isto o conservador aprova como instrumento de liberdade e de ordem. Um governo justo mantém uma tensão saudável entre as reivindicações da autoridade e as reivindicações da liberdade.

Décimo, o pensador conservador compreende que a estabilidade e a mudança devem ser reconhecidas e reconciliadas em uma sociedade robusta

O conservador não se opõe ao aprimoramento da sociedade, embora ele tenha suas dúvidas sobre a existência de qualquer força parecida com um místico Progresso, com P maiúsculo, em ação no mundo. Quando uma sociedade progride em alguns aspectos, geralmente ela está decaindo em outros. O conservador sabe que qualquer sociedade sadia é influenciada por duas forças, que Samuel Taylor Coleridge chamou de Conservação e Progressão (Permanence and Progression). A Conservação de uma sociedade é formada pelos interesses e convicções duradouros que nos dão estabilidade e continuidade; sem esta Conservação as fontes do grande abismo se dissolvem, a sociedade resvala para a anarquia. A Progressão de uma sociedade é aquele espírito e conjunto de talentos que nos instiga a realizar uma prudente reforma e aperfeiçoamento; sem esta Progressão, um povo fica estagnado.

Por isto o conservador inteligente se esforça por reconciliar as reivindicações da Conservação e as reivindicações da Progressão. Ele pensa que o progressista e o radical, cegos aos justos reclamos da Conservação, colocariam em perigo a herança que nos foi legada, num esforço de nos apressar na direção de um duvidoso Paraíso Terrestre. O conservador, em suma, é a favor de um razoável e moderado progresso; ele se opõe ao culto do Progresso, cujos devotos crêem que tudo o que é novo é necessariamente superior a tudo o que é velho.

Os devotos do Progresso crêem que tudo o que é novo é necessariamente superior a tudo o que é velho.

O conservador raciocina que a mudança é essencial para um corpo social da mesma forma que o é para o corpo humano. Um corpo que deixou de se renovar, começou a morrer. Mas se este corpo deve ser vigoroso, a mudança deve acontecer de uma forma harmoniosa, adequando-se à forma e à natureza do corpo; do contrário a mudança produz um crescimento monstruoso, um câncer que devora o seu hospedeiro. O conservador cuida para que numa sociedade nada nunca seja completamente velho e que nada nunca seja completamente novo. Esta é a forma de conservar uma nação, da mesma forma que é o meio de conservar um organismo vivo. Quanta mudança seja necessária em uma sociedade, e que tipo de mudança, depende das circunstâncias de uma época e de uma nação.

Assim, este são os dez princípios que tiveram grande destaque durante os dois séculos do pensamento conservador moderno. Outros princípios de igual importância poderiam ter sido discutidos aqui: a compreensão conservadora de justiça, por exemplo, ou a visão conservadora de educação. Mas estes temas, com o tempo que passa, eu deverei deixar para a sua investigação pessoal.

Eric Voegelin costumava dizer que a grande linha de demarcação na política moderna não é a divisão entre progressistas de um lado e totalitários do outro. Não, de um lado da linha estão todos os homens e mulheres que imaginam que a ordem temporal é a única ordem e que as necessidades materiais são as únicas necessidades e que eles podem fazer o que quiserem do patrimônio da humanidade. No outro lado da linha estão todas as pessoas que reconhecem uma ordem moral duradoura no universo, uma natureza humana constante e deveres transcendentes para com a ordem espiritual e a ordem temporal.


Referências
  • Adaptado de “A Política da Prudência”. Tradução do original inglês feita pelo Pe. Paulo Ricardo e publicada originalmente em 18 de setembro de 2006.
Notas
  1. Test Act: lei inglesa de 1673 que exigia dos titulares de cargos civis e militares professarem a fé da Igreja Anglicana através de uma fórmula de juramento (N. do T.).
  2. Declaração oficial da doutrina da Igreja Anglicana (N. do T.).
  3. A frase Chaos and Old Night provém do poema épico “Paraíso Perdido” (Paradise Lost), de John Milton (I, 544). Milton usa esta frase para se referir à “matéria” a partir da qual Deus ordenou e criou o mundo (N. do T.).
  4. William Buttler Yeats, The Second Coming (N. do T.).


O CONSERVADORISMO VAI À FACULDADE

questões estatísticas

O CONSERVADORISMO VAI À FACULDADE

Pesquisa Ibope revela que proporção de conservadores cresceu mais rapidamente entre brasileiros com diploma universitário

JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
11abr2018_11h15
Oconservadorismo cresce no Brasil principalmente entre os mais escolarizados, revela o Ibope. Pesquisa inédita e divulgada em primeira mão pela piauí mostra que, embora a variação tenha sido marginal no conjunto da população entre 2016 e 2018, o índice de conservadorismo cresceu muito acima da média entre quem fez faculdade. O índice reflete a proporção de brasileiros que apoiam ou refutam cinco propostas: casamento de pessoas do mesmo sexo, legalização do aborto, redução da maioridade penal, prisão perpétua para crimes hediondos e adoção da pena de morte.
A proporção da população com alto grau de conservadorismo cresceu de 49% em 2010 para 54% em 2016 e chegou a 55% em 2018.
Esta é a terceira vez que o Ibope calcula esse índice. Entre a primeira e a segunda vez, o conservadorismo teve um crescimento significativo em quase todos os extratos sociais, puxado pelas questões sobre segurança pública. O apoio tanto à pena de morte quanto à redução da idade mínima para alguém ser preso e condenado foi o que alavancou a parcela de conservadores na sociedade brasileira entre 2010 e 2016. À época, esse crescimento se concentrou entre quem tinha passado menos tempo na escola. Nos últimos dois anos o fenômeno se inverteu.
De 2016 para 2018, o conservadorismo cresceu mais entre quem fez faculdade, mas também entre quem cursou o ensino médio, enquanto refluía um pouco entre as pessoas que não passaram do ensino fundamental. Essa mudança pode ter duas origens: os mais escolarizados se tornaram mais conservadores ou os conservadores se tornaram mais escolarizados. Seja qual for a ordem dos fatores, o produto dessa mudança é que desfez-se a escada do conservadorismo na qual cada degrau de escolaridade conduzia a um aumento do liberalismo de costumes e contra o punitivismo.
Na mais recente pesquisa do Ibope, concluída este ano, o índice de conservadorismo revela-se praticamente tão alto quanto para quem passou quatro, oito ou doze anos na escola. Ainda há proporcionalmente menos conservadores entre quem passou pela universidade, mas mesmo essa diferença está ficando menor na comparação com os segmentos menos escolarizados da população.
Os brasileiros contrários à legalização do aborto eram 78% em 2016 e são 80% em 2018. Os favoráveis à pena de morte continuam no mesmo patamar: eram 49% e são 50%. O mesmo ocorreu com os que defendem a prisão perpétua para crimes hediondos (oscilaram de 78% para 77%). Houve pequeno refluxo do apoio à redução da maioridade penal (de 78% para 73%), mas cresceu a rejeição ao casamento entre pessoas do mesmo sexo (de 44% para 50%).
CEO do Ibope Inteligência, Marcia Cavallari explica que as principais preocupações do brasileiro hoje são: desemprego, corrupção, saúde e segurança pública. Ela tem uma hipótese para explicar o crescimento do conservadorismo: “Além dessas preocupações, estamos passando por uma crise institucional que abarca a economia, a política, o social e a moral, por isso há um desejo da reconstrução dos valores. E esse desejo juntamente com o problema da segurança pública faz com que haja um conservadorismo maior da população, principalmente entre os mais escolarizados”.
Quando se olha para o que aconteceu na divisão geográfica do conservadorismo percebe-se que o Sudeste tornou-se mais conservador do que o Nordeste. O crescimento conservador foi constante nos estados mais ricos do Brasil, como São Paulo e Rio de Janeiro, tanto entre 2010 e 2016 quanto entre 2016 e 2018. Já no conjunto dos estados nordestinos, mais pobres, houve refluxo do conservadorismo nos dois últimos anos, segundo o Ibope.
Como resultado, a proporção de conservadores só não é maior hoje no Sudeste do que no Norte/Centro-Oeste. Foi no conjunto dessas duas regiões que o conservadorismo deu seu maior salto nos dois últimos anos. Em contraste com essa mudança, não houve variação significativa nos estados do Sul entre 2016 e 2018. O índice de conservadorismo hoje é equivalente no Nordeste e no Sul do país.
Os evangélicos seguem sendo os mais conservadores entre os brasileiros, com um aumento constante do índice entre eles desde 2010. O conservadorismo também cresceu entre os católicos, mas em proporção menor – e desacelerou nos dois últimos anos. Proporcionalmente, porém, o crescimento recente do conservadorismo foi maior no segmento onde essa característica era menos pronunciada: entre quem não é católico nem evangélico.
Embora nem sempre seja possível estabelecer relação de causa e efeito entre conservadorismo de costumes (contra a legalização do aborto e o casamento de homossexuais) e punitivismo (apoio à pena de morte, redução da maioridade penal e prisão perpétua) com a opção eleitoral dos brasileiros, os resultados da pesquisa do Ibope indicam que candidatos de perfil mais conservador terão maior facilidade para sensibilizar o eleitor do que os liberais.
O discurso genérico que apoia punições mais severas para crimes e que pretende brecar o avanço da liberalização dos costumes encontra menos resistência em quase todos os segmentos sociais. Isso só não implica automaticamente uma onda conservadora nas urnas porque o moralismo costuma ser temperado pelo bolso. O eleitor é pragmático e vota, principalmente em eleições majoritárias, para tentar melhorar sua condição econômica.
Quanto maior for a sensação de prosperidade na época da eleição, menor será o peso da economia na decisão do voto e, portanto, sobrará mais espaço para o avanço de candidatos conservadores. Porém, a continuar a estabilidade em baixo patamar da confiança do consumidor, o bolso ainda tende a falar mais alto na urna.


JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO (siga @zerotoledo no Twitter)

Jornalista da piauí, foi repórter e colunista de política na Folha e no Estado de S. Paulo e presidente da Abraji

O Estado de S. Paulo - Diplomata admirador de Trump vai chefiar Itamaraty

O Estado de S. Paulo - Diplomata admirador de Trump vai chefiar Itamaraty

15/11/2018
Em artigos, Ernesto Araújo critica ‘ideologia globalista’ e defende ‘nacionalismo ocidental’ do presidente dos EUA

Breno Pires Luciana Dyniewicz / BRASÍLIA Ricardo Galhardo / COLABORARAM LU AIKO OTTA e BEATRIZ BULLA

Diplomata. Ernesto Araújo ao ser anunciado para o cargo de ministro das Relações Exteriores
O diplomata Ernesto Araújo, de 51 anos, será o ministro das Relações Exteriores do governo de Jair Bolsonaro. Promovido a embaixador em junho, Araújo dirige o Departamento de Estados Unidos, Canadá e Assuntos Interamericanos do Itamaraty. Durante a disputa eleitoral, o futuro ministro criou blog no qual criticou o PT, que classificou de “Partido Terrorista”. Em artigos, ele fez críticas à esquerda e ao que chama de “ideologia globalista” e defendeu o “nacionalismo ocidental” do presidente americano Donald Trump. Cabe ao chanceler atuar na formulação e conduzir a política externa do Brasil. Analistas ouvidos pelo Estado apontaram a escolha de Araújo como polêmica e com potencial foco de conflitos com áreas do governo como a militar, o setor exportador do agronegócio e o próprio Itamaraty.

O presidente eleito, Jair Bolsonaro, anunciou ontem o diplomata Ernesto Araújo como o seu futuro ministro das Relações Exteriores. Promovido a embaixador em junho passado, Araújo ainda não havia chefiado nenhuma sede diplomática. Em artigos e blogs, ele tem um discurso alinhado com o de Bolsonaro, é crítico da esquerda e do que chama de “ideologia globalista” e defende o “nacionalismo ocidental” do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

Pelo Twitter, o presidente eleito justificou a escolha afirmando que Araújo é um “brilhante intelectual” e “a política externa brasileira deve ser parte do momento de regeneração que o Brasil vive hoje”.

O futuro ministro, de 51 anos, atualmente é diretor do Departamento de EUA, Canadá e Assuntos Interamericanos do Itamaraty. No cargo de ministro, caberá a ele atuar na formulação e conduzir a política externa do Brasil com outros países e organismos internacionais. Durante a eleição, Araújo criou um blog em que atacava o PT e defendia Bolsonaro.

Nem o presidente eleito nem Araújo deram detalhes do que deve ser a diretriz da pasta das Relações Exteriores no novo governo. Já está claro, porém, que a ideia é romper com a linha adotada pelos governos petistas. A avaliação no entorno do presidente eleito é que o Itamaraty foi aparelhado e que sua atuação ficou limitada ao relacionamento com os países ditos “bolivarianos”.

Essa linha já foi rompida pela atual gestão, como reconheceu o futuro chanceler numa carta divulgada ontem. “Aprofundaremos iniciativas lançadas com competência pela atual gestão”, escreveu Araújo. Na carta, ele enaltece o presidente eleito. “Bolsonaro com amor e coragem!”, escreveu. “Este é o lema do candidato em que sempre acreditei, junto com tantos milhões de brasileiros (...). A mão firme e confiante do presidente Bolsonaro nos guiará.”

Analistas da política externa ouvidos pelo Estado apontaram a escolha como polêmica e com potencial foco de conflitos com áreas do governo, como a militar, o setor exportador do agronegócio e o próprio Itamaraty. A avaliação tem como base textos publicados em revistas especializadas e no blog Metapolítica 17, em que expõe suas visões políticas.

O principal ponto é a crítica ao “globalismo”, que ele classifica como “a globalização econômica que passou a ser pilotada pelo marxismo cultural”. “É um sistema anti-humano e anticristão”, escreveu Araújo no seu blog. Para ele, o ocidente seria vítima de uma articulação global que teria como raiz a “China maoísta” e o presidente eleito seria o único capaz de evitar a dissolução da nacionalidade brasileira – que seria fundamentalmente cristã e conservadora. Em um outro texto, chama o PT de “Partido Terrorista”.

“Essa nomeação pode criar um imbróglio dentro do próprio governo”, disse o professor de história da Política Externa da Faap, David Magalhães. Segundo o professor, as ideias do futuro chanceler reproduzem em vários momentos os argumentos do filósofo Olavo de Carvalho.

Em um artigo publicado na revista do Instituto de Pesquisa e Relações Internacionais (Ipri), vinculado ao Itamaraty, ele afirma que “somente um Deus poderia ainda salvar o Ocidente, um Deus operando pela nação – inclusive e talvez principalmente a nação americana”. E, ao final, sugere: “Somente Trump pode ainda salvar o Ocidente”.

O embaixador considera que a imagem de Trump fica contaminada pela conotação negativa com que a imprensa americana trata o presidente. A interlocutores, Fraga avaliou que o Brasil precisa estreitar laços com os americanos, por exemplo, por meio da ênfase na parceria com EUA no mercado da indústria de defesa e cibersegurança.

Discrição. Os textos pavimentaram o caminho de Araújo até o posto de chanceler do futuro governo. Por ser relativamente jovem e não ter experiência como embaixador, era tido como um “azarão” nas bolsas de apostas.

Gaúcho, formado em Letras e escritor, Araújo é descrito por colegas como uma pessoa discreta e até mesmo introvertida. A retórica assertiva que se vê nos artigos e no blog não aparece no dia a dia do trabalho.

O diplomata fez sua carreira em postos relacionados com temas econômicos, como a União Europeia, Genebra e Alemanha. Em Washington, foi ministro conselheiro para área econômica. Há pelo menos 10 anos se dedica à relação com os EUA. Araújo é casado com a também diplomata Maria Eduarda Seixas Corrêa e genro do ex-secretário-geral do ministério Luís Felipe Seixas Corrêa.

“O remédio é voltar a querer grandeza. Encha o peito e diga: Brasil Grande e Forte. Milhares de pequenos esquerdistas imediatamente te atacarão como formigas quando você chuta o formigueiro, mas se você resistir e não recuar eles ficarão desorientados e se dispersarão na sua insignificância, deixando aberto o campo para construirmos um país de verdade.”

POSTAGEM DE 3 DE NOVEMBRO NO BLOG METAPOLÍTICA 17 CONTRA O GLOBALISMO

“O projeto metapolítico significa, essencialmente, abrir-se para a presença de Deus na política e na história.”

TRECHO DO TEXTO DO PERFIL DO AUTOR DO BLOG METAPOLÍTICA 17 CONTRA O GLOBALISMO

“O presidente Donald Trump propõe uma visão do Ocidente não baseada no capitalismo e na democracia liberal, mas na recuperação do passado simbólico, da história e da cultura das nações ocidentais. A visão de Trump tem lastro em uma longa tradição intelectual e sentimental, que vai de Ésquilo a Oswald Spengler, e mostra o nacionalismo como indissociável da essência do Ocidente. Em seu centro, está não uma doutrina econômica e política, mas o anseio por Deus, o Deus que age na história. (...) O Brasil necessita refletir e definir se faz parte desse Ocidente.” TRECHO DO ARTIGO ‘TRUMP E O OCIDENTE’, QUE CONSTA DO Nº 6 DOS ‘CADERNOS DE POLÍTICA EXTERIOR’ DO INSTITUTO DE PESQUISA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS (IPRI)