DO PEDALINHO AO VIADUTO
19/01/2018
O viaduto Dona Marisa Letícia leva ao paraíso. Não o bairro
paulistano, mas o nirvana mesmo. O lugar onde não há culpa, só prazer. Exemplo:
o contribuinte brasileiro (você) está pagando US$ 3 bilhões aos americanos pelo
assalto de Lula à Petrobras. Enquanto isso, o próprio Lula é convidado para uma
animada partida de futebol com Chico Buarque – uma espécie de celebração à
delinquência, provando de uma vez por todas que o crime compensa, se tiver a
embalagem certa. A única injustiça é você pagar e não ser convidado para jogar
também.
Aí a maior cidade da América Latina inaugura uma obra viária
com o nome da recém-falecida esposa do maior assaltante da história nacional.
Criminoso este já condenado e, agora, em vias de ser preso. Detalhe: a própria
homenageada, antes de falecer, estava sendo investigada como cúmplice do marido
em seus crimes de corrupção passiva – sendo os mais visíveis deles o do tríplex
em Guarujá e o do sítio em Atibaia, aquele que tinha os pedalinhos
personalizados “Lula & Marisa”. Os autores da homenagem devem ter imaginado
que quem já batizou pedalinho pode batizar viaduto sem problema nenhum.
É disso que
o Brasil está brincando nos dias de hoje: passar a mão na cabeça de bandido
simpático para ver se salva a lenda populista. Está dando certo. Existe
por exemplo uma horda de indignados com o desabafo comovente do mesmo Chico
Buarque, dando conta de que não consegue mais andar nas ruas do Leblon sem
ouvir o bordão “vai pra Cuba, viado”. É mesmo uma grosseria. Resta saber onde
estariam os grossos se o cantor não tivesse virado marqueteiro de bandido.
Possivelmente estivessem remoendo em silêncio a sua grossa insignificância.
Leia mais de Guilherme Fiuza:
A liga da justiça a jato Brincando de apartheid Proibido proibir (mentir, pode)
A liga da justiça a jato Brincando de apartheid Proibido proibir (mentir, pode)
É um enigma insondável essa compulsão de alguns grandes
artistas por causas vagabundas. Em Hollywood há uma penca de estrelas, também
de inegável talento, comprometidas com a ditadura sanguinária da Venezuela –
todos fingindo que o chavismo é a redenção dos pobres do Terceiro Mundo. Assim
como os falsos heróis brasileiros, são personalidades que não precisariam
dessas lendas fajutas, por já serem, eles mesmos, figuras lendárias (graças à
sua própria obra). Ou seja: renunciam à grandeza para besuntar a reputação de
verniz falso. Poderia ser altamente pedagógico se, entre um e outro “vai pra
Cuba, viado”, surgisse um “se olha no espelho, querido”.
Enquanto houver gente para propor e para tolerar um viaduto
homenageando a primeira-dama do petrolão, esse espelho vai sempre refletir um
líder revolucionário em lugar do oportunista melancólico. E esse oportunismo
faz escola. Entre os candidatos a reabilitar o PT do maior assalto da história
estão também procuradores, juízes e outros fascinados com os ganhos fáceis
proporcionados pelo tal verniz de esquerda – cuja falsidade se constata num
simples olhar para Lula ou Maduro: picaretagem não tem lado, muito menos
ideologia.
Rodrigo Janot, de triste memória, está sendo convocado pela
Polícia Federal para depor sobre a farsa da delação de Joesley – na verdade uma
conspiração tosca para tentar devolver o poder aos companheiros. Entre os
cúmplices da malandragem malsucedida estão ministros do STF como Edson Fachin,
hoje também conhecido como Edson Facinho, dada a celeridade sem precedentes com
que homologou o truque mambembe – contando com a altiva cobertura da
companheira presidenta da Corte. Aí você fica sabendo que as provas de Mônica
Moura (alguém se lembra dela?) contra Lula e Dilma ficaram sete meses paradas
no Supremo – e constata até que ponto pode chegar o altruísmo para com os
protagonistas da lenda.
Personagens soltinhos da silva como Dirceu, Dilma e agora
até o lendário mensaleiro Pizzolato (obrigado, companheiro Barroso) estão
conspirando à vontade e falando pelos cotovelos, com o caixa cheio para
promover suas micaretas revolucionárias. Enquanto isso, os outrora diligentes
investigadores da Lava Jato – destaque cheio de purpurina para o mosqueteiro
Dartagnol Foratemer – estão fazendo comício no Twitter e cuidando, também eles,
de se besuntar da lenda salvacionista à prova de espelho.
Ou o Brasil sobe o viaduto das panelas acelerando para ver
se chega ao paraíso ou mostra com todas as letras que futebol de bandido é no
presídio.
Fonte: “Época”, 18/01/2018
Jornalista e escritor brasileiro, Guilherme Fiuza mantém uma
coluna sobre política na revista "Época" e escreve para o jornal "O
Globo". É co-autor da minissérie "O brado retumbante", exibida
em 2012 pela TV Globo, e assina o livro "Meu nome não é Johnny" cuja
adaptação ao cinema rendeu ao escritor o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro na
categoria Melhor Roteiro Adaptado. Além deste, Fiuza escreveu "3.000 dias
no bunker", "Amazônia, 20º andar", “Bussunda - A vida do
Casseta” e "Giane — Vida, arte e luta". (Foto: Leo Aversa)
Nenhum comentário:
Postar um comentário