domingo, 10 de julho de 2016

A Justiça e a Sociedade

Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Carlos Henrique Abrão e Laercio Laurelli


Cobram do judiciário amiúde a responsabilidade pelo momento que atravessamos e sempre infundem a razão da morosidade e de apadrinhamento entre os poderes da República .A sociedade clama pelo fim da corrupção e pela transparência da justiça e com muita propriedade, haja vista que é nela a maior esperança e talvez única expectativa para a solução das mazelas cometidas com frequência pelo Executivo e Legislativo.

Dizem que juízes se transforam em mitos e portanto ultrapassaram limites da razoabilidade, mas não é assim. Fato é que a grande maioria dos magistrados não enxerga o bem estar individual e as vantagens, mas sim espelha o que anseia o bem comum e também incremento da valorização de conceitos impregnados nas vantagens que favoreçam aos menos aquinhoados pela distribuição de renda e serviços sociais desajustados de um modelo democrático.


O prende e solta se tornou mote e um perigoso precedente poderá transformar a esperança da maioria em desassossego a curto prazo. Quando se decidiu pela prisão antes do transito em julgado se verificaram as circunstâncias estatísticas de baixa reforma da decisão e o que representa em termos de impunidade o criminoso ficar anos a fio solto até vir a cumprir sua pena no regime fechado.

Decisões recentes vindas dos Tribunais Superiores são inquietantes e ao
mesmo tempo preocupantes. As ruas berram por justiça. A população ensandecida não aguenta mais falar ouvir sobre corrupção e a sociedade dará seu recado nas urnas agora em outubro isso é inconteste. No entanto, o benefício da dúvida que ostenta a culpabilidade agora se convolou em benefício da dividia já que ao se determinar a soltura mediante condições de se colocar tornozeleira, eis que o Estado quebrado não tem meios financeiros para comprar.

Daí que se tem em mente o seguinte: se o Estado é corrupto e corruptor,
o Estado juiz deve seguir o caminho oposto e ter mecanismo próprio de controle e supervisão. Os desvios do dinheiro público são graves e representam o maior descaso com o Estado e a sociedade, de tal sorte que a soltura imediata e ao alvedrio de quem profere a decisão monocrática também empurra a crítica e faz com que o órgão colegiado, superado o recesso, se debruce sobre a causa e traga o pronunciamento a respeito da prisão ou a alternativa de liberdade.

Convivemos com a mais grave crise que assola a economia e traz um retrato melancólico de doze milhões de pessoas sem emprego, mas a barafurdia  foi provocada e causada pelo Estado leniente, gastão e sem o papel de bom administrador, o que coloca em relevo a perseguição frontal contra os grandes violadores da legislação, temerários de dias de festança quando livres ou preferencialmente com salvaguardas que se lhes assegurem a impunidade ou a continuidade delituosa.

Muito do que hoje experimentamos, do fel da corrupção, em grande parte se deve à expressão foro privilegiado e a demora incomum de serem julgados os nobres parlamentares e demais políticos, pois o STF tem para julgamento mais de 500 processos um desafio incomum que demandaria mais de uma década para o término de tantas ações e sabemos que ele não foi concebido para ser uma corte de instrução ou de preparação de provas para exarar o veredicto. Tudo já vem pronto e sua visão é constitucional e de repetir a precaução de consolidar sua jurisprudência.

Os Tribunais superiores quando resolvem soltar aqueles detidos em operações de repercussão nacional ou internacional raramente deveriam fazê-lo pela via da decisão isolada ou monocrática, até porque a ordem pública estão sendo testada, a chaga do desvio e o perigo que representam em termos de sucatear a maquina e consequentemente saírem do espaço territorial no qual se processa a ação penal. E uma das características primordiais que devemos ter em mente é o valor do prejuízo cometido, pois que a fiança, acaso fixada deverá ser proporcional e no mínimo assegurar a possibilidade de restituição do numerário surrupiado.

O momento é de reflexão e não simples e puramente de um ponto fora da curva, já que como vitrine a Justiça passa a ser analisada diariamente não apenas pela mídia mas essencialmente por meio da opinião pública. Muitas solturas que acontecem envolvendo milhões de reais desviados causam estranheza na sociedade e abrem um verdadeiro precipío entre o judiciário e o cidadão comum,já que pela fresta enxerga que os poderosos não ficarão presos e ao passo toda pessoa humilde não terá condições de se defender ou contratar um advogado de porte que seja capaz de encabeçar uma tese de inocência perante as cortes superiores.

O Brasil está à deriva mas agora exerce um papel preponderante em toda a América Latina,no sentido de que a corrupção,a roubalheira e odesvio de dinheiro público esses elementos estão sendo vigiados e constantemente aperfeiçoados pela Controladoria Geral da União, por meio do Tribunal de Contas, a cargo do Ministério Público e substancialmente pelas mãos limpas
da Justiça. Não é tempo de esmorecer ou de se estabelecer o benefício da dívida, se o Estado juiz manda o Estado comprar a tornozeleira é fundamental que algo seja feito ou se passe a aquisição por meio da justiça que terá formas mais seguras e transparentes de compra.

A criminalidade dá saltos invencíveis para a justiça em todos os setores, crimes contra a vida, contra a liberdade de expressão,contra os costumes e invariavelmente contra o patrimônio. Assistimos estarrecidos empresas transportadoras de valores sendo alvo de ações paramilitares com morteiros, bombardeios e armas que se usam na guerra, mas a reação é somente de adiar uma solução que imprima crime hediondo, pena mínima de 15 anos para os delitos e regime fechado sem qualquer regalia.

Necessitamos seguir, em termos de prisão, o modelo norteamericano que igualmente ao europeu não recalcitram em manter preso o individuo que apresenta traços delinquenciais, e quando se revolver fixar a fiança que seja proporcional ao valor subtraído a ponto de impor certeza que a delituosidade será refreada na sua base.

A percepção que Legislativo e Executivo não fazem seus deveres de casa coloca em evidencia o papel do Estado Juiz e esse não poderá, em hipótese alguma, decepcionar a sociedade civil que ambiciona no futuro próximo a libertação ou ao menos a destruição frontal dos crimes de corrupção, lavagem, contra a administração pública e rombos nas contas com repercussão na precariedade dos serviços públicos e a dinâmica do crime em progressão geométrica na mesma simetria da impunidade.

Se não gerarmos uma assimetria entre ambos o Brasil do futuro não romperá com o vezo do passado e muito menos combaterá seus erráticos modo de agir do presente.

Carlos Henrique Abrão (na ativa) e Laercio Laurelli (aposentado) são Desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo. Autores de obras jurídicas.



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