VENEZUELA
Maduro diz que não se renderá. Repressão chavista deixa 13 mortos
Apoio popular. Venezuelanos erguem as mãos, na gigantesca manifestação em Caracas, durante o juramento de Juan Guaidó. Foram registrados atos em todo o país, com presença muito acima das expectativas da própria oposição
Com centenas de milhares de venezuelanos nas ruas do país, o presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, declarou–se “presidente da Venezuela. Foram registradas 13 mortes após violenta repressão chavista. Os Estados Unidos, o Brasil e outros 11 países das Américas reconheceram a reivindicação de Guaidó. O presidente Nicolás Maduro afirmou que não se renderá e rompeu relações com os EUA. Em Davos, o presidente Bolsonaro disse que dará “todo o apoio necessário” à mudança de regime na Venezuela. No Brasil, o presidente em exercício, Hamilton Mourão, descartou participação do país em intervenção militar.
Diante de uma manifestação gigantesca, que levou centenas de milhares de pessoas às ruas em toda a Venezuela e superou amplamente as expectativas da oposição, o presidente da Assembleia Nacional (AN), Juan Guaidó, declarou assumir “formalmente as competências do Executivo Nacional como presidente encarregado” do país. O jovem líder opositor, de apenas 35 anos, vinha sendo pressionado para tomar esta decisão, mas parece ter esperado areação popular dos protestos de ontem para dar opas soque a oposição esperava.
—Aqui não existe nada paralelo, o exercício do poder é aqui — disse o presidente da AN em Caracas, derrubando teorias sobre a criação de um governo paralelo no exterior, nos moldes do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) no exílio, que não é reconhecido pelo Palácio de Miraflores. — Não deixaremos o povo sozinho. Enquanto Maduro não protege ninguém, nós resgataremos a Constituição, os direitos humanos. Hoje, entendendo que estamos numa ditadura, chegaram a perguntar se teríamos coragem. Estamos na rua com o povo que, unido, jamais será vencido.
Os protestos começaram já na madrugada de ontem e, principalmente no interior, foram alvo de repressão pelas forças do governo. Até o final da tarde, haviam sido registradas 13 mortes no contexto das manifestações que culminaram coma proclamação de Guaidó. Seu juramento foi reconhecido ainda ontem por pelo menos 13 países, incluindo Brasil e EUA, e pelo secretário– geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro.
A RESPOSTA DE MADURO
Diante do maior desafio ao seu governo desde que herdou o poder de Hugo Chávez, em 2013, o presidente Nicolás Maduro reagiu no fim do dia. Do Palácio de Miraflores, anunciou o rompimento de relações diplomáticas com os EUA.
—Dou 72 horas para que toda a equipe diplomática abandone o país — disse Maduro. — Aqui ninguém se rende, ninguém se entrega. Vamos rumo ao enfrentamento, ao c om bate, à vitória da paz, da vida, da democracia e do futuro.
Ele então acusou os EUA de tentarem promover aqueda de seu governo.
—É um gravíssima insensatez da política extremista do governo de Donald Trump contra a Venezuela tentar dividir o país, tentar destruir suas instituições democráticas e tentar impor um governo por vias inconstitucionais.
Entretanto, o Departamento de Estado americano negou em comunicado que Maduro tenha legitimidade para romper com os EUA e disse que continuará a manter relações coma Venezuela “através do governo interino do presidente Guaidó”. O secretário de Estado, Mike Pompeo, ameaçou tomar medidas contra “quem quer que ponha em perigo a segurança da nossa missão e de seu pessoal”.
Embora sua própria reeleição, em maio de 2018, tenha ocorrido com abstenção recorde ( de 54% dos eleitores) e sob boicote da oposição, Maduro sustentou no discurso que chegou ao poder pelo voto. Contrariando expectativas, ele não compareceu ao ato de seus apoiadores no centro de Caracas, onde foi representado por Diosdado Cabello, presidente da governista Assembleia Nacional Constituinte.
As Forças Armadas, também aliadas a Maduro, saíram em defesa do chavista e disseram não reconhecer um “presidente imposto” e “autoproclamado fora da lei”, nas palavras do ministro da Defesa, Vladimir Padrino.
Ao longo do dia, apoiadores de Maduro chegaram ase reunirem atos—estes, porém, bem menos expressivos que as marchas da oposição. Foi de um ato pró–governo em Caracas que Cabello convocou os chavistas para uma vigília diante da sede do governo. Cabello acusou os opositores de desrespeitarem a Constituição e os ameaçou:
—Se eles cruzarem alinha, a Justiça entrará e mação. Somos obrigados a preservara paz do país. A direita volta a causar terror no nosso povo, mas hoje é um dia do povo que foi traído e nunca mais voltará a ser — acrescentou ele, em alusão ao golpe que derrubou o general Marcos Jimenez Pérez em 23 de janeiro de 1958.
TRIBUNAIS EM CONFRONTO
Foi justamente este o motivo pelo qual a oposição escolheu o dia de ontem para o protesto nacional contra Maduro, que culminou com o juramento de Guaidó. Sua proclamação era uma especulação, mas poucos esperavam que fosse feita ontem, já que a AN está debatendo um projeto de lei sobre o que a oposição já chama de governo de transição. O texto ainda não foi votado.
De acordo com o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) no exílio, Guaidó já estava em condições de assumir como “presidente encarregado” da Venezuela, já que a AN declarou um “vazio de poder” após a posse de Maduro para um segundo mandato, não reconhecido por mais de 40 países.
Já o TSJ venezuelano —que, ao contrário do TSJ no exílio, é governista — determinou ao Ministério Público que investigue criminalmente os Parlamento. O Legislativo, que havia declarado Maduro um “usurpador” ,é agora acusado pelo TSJ de usurpar as funções do presidente.
Os protestos de ontem vinham sendo convocados pela oposição desde aposse de Maduro em 10 de janeiro, no rastro do agravamento da pior crise da História da Venezuela. Em 2018, a inflação atingiu 1.700.000% e as projeções são de que chegue a 10.000.000% neste ano. O desabastecimento de remédios e alimentos alcança 90%, e o PIB do país caiu 55% entre 2013, quando Maduro assumiu, e 2018. A tragédia humanitária levou cerca de três milhões de pessoas a deixarem o país desde 2015, boa parte delas se espalhando por países vizinhos.
Várias cidades da Venezuela amanheceram tomadas por manifestantes. Centenas de milhares de pessoas marchavam em todo o país exibindo cartazes com apelos à liberdade e à saída de Maduro do poder. Diferentemente de manifestações anteriores da oposição, apontaram observadores, as de ontem pela primeira vez congregaram pessoas de todas as classes sociais, inclusive de redutos chavistas.
“NÃO QUERO BÔNUS”
Algumas cantavam o Hino Nacional. Outras bradavam: “Não quero bônus, não quero Claps, quero que Nicolás saia”, referindo–se ao sistema paralelo de distribuição de alimentos por meio dos Comitês Locais de Abastecimento e Produção, mercados mantidos pelo governo para a venda aos venezuelanos mais pobres.
—Precisamos de liberdade, precisamos que esse governo corrupto saia, precisamos todos nos unir, para que então haja paz na Venezuela —disse Cláudia Olaizola, uma vendedora de 54 anos na marcha no bairro de Chacao, em Caracas. (Com agências internacionais)
“Não deixaremos nosso povo sozinho. Enquanto Maduro não protege ninguém, nós resgataremos a Constituição, os direitos humanos. Hoje damos um passo a mais” _ Juan Guaidó, presidente da Assembleia Nacional, ao se declarar chefe de Estado interino
“Aqui ninguém se rende, ninguém se entrega. Vamos rumo ao enfrentamento, ao combate, à vitória da paz, da vida, da democracia e do futuro” _ Nicolás Maduro, presidente venezuelano, em resposta à declaração de Guaidó
“Precisamos de liberdade, precisamos que esse governo corrupto saia, precisamos todos nos unir, para que então haja paz na Venezuela” _ Cláudia Olaizola, vendedora, ao participar de uma manifestação contra Maduro em Caracas
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